2022 tinha prometido muito, mas a verdade é que uma temporada na qual apenas uma equipa fora do Top 3 consegue um único pódio dificilmente pode ser classificada como uma época entusiasmante. Para este ano as expectativas serão de uma aproximação das rivais aos eternos líderes, mas será essa uma expectativa razoável?
A temporada chega numa altura em que Mohammed ben Sulayem dá um passo atrás no seu envolvimento (excessivo) na categoria, e em que a FIA procura atingir um novo equilíbrio no seu relacionamento com a FOM.
Falando da FIA, esta criou várias alterações nos regulamentos desportivos, com testagem de novos pneus de chuva a partir de Imola, menos restrições de rádio, modificações a circuitos e zonas de DRS, ajustes no teto orçamental e acesso facilitado para auditorias da FIA.
Mudanças na Ferrari terão sido no timing certo?
A única coisa mais impressionante do que a maneira como a Ferrari abriu 2022 com uma sequência de ótimos resultados foi seguida de uma ainda mais impressionante hecatombe de resultados, em que vitórias desperdiçadas por motivos de estratégia deram lugar a vitórias desperdiçadas por entretanto o carro italiano já não ser o mais competitivo do pelotão.
Há mérito da Red Bull neste quesito, com uma eficiência diabólica, mas a sensação geral de oportunidade desperdiçada (e recusa em assumir erros) fez Frédéric Vasseur assumir os comandos da Scuderia. A retirada de um líder italiano pela entrada de um francês é notória e acarreta consigo a possibilidade de um começo de fresco. Mas, mesmo não sendo particularmente justo, Vasseur não conseguirá segurar o lugar se o trabalho que até Dezembro era de Mattia Binotto não der resultados concretos…
E no meio de tudo está uma Mercedes desejosa de conseguir voltar a assumir o protagonismo no campeonato.
Os testes de pré-temporada, para já, pintam um quadro bem risonho para a Red Bull. A AMuS noticia o motivo desta vantagem como a capacidade do RB19 em conseguir correr bem mais perto do chão que as rivais, o que deixa Max Verstappen numa posição bem confortável para tentar chegar a um tricampeonato (Sergio Pérez deverá manter-se como plano de contingência, com Daniel Ricciardo a observar tudo bem de perto no seu papel de piloto de testes).
Para a Mercedes vê-se uma performance bem mais consistente que a de 2022, ainda que com bem menores problemas de porpoising. Só que crê-se que o verdadeiro potencial do carro só será descoberto com atualizações em Baku nos monolugares de Lewis Hamilton e George Russell. Já a Ferrari pareceu difícil de localizar, com alguns acertos de setup a serem necessários para conseguir estabelecer a performance de um carro que parece fiável e rápido, mas uns furos abaixo do Red Bull.
Trabalho difícil para Charles Leclerc e Carlos Sainz, portanto.
Harmonia difícil na Alpine
Já é piada recorrente do paddock referir que a estrutura da Alpine corre já em vários planos de 5 anos. Apesar de se ter integrado em 2016 com promessas de competitividade em 5 anos, a Renault avisou logo que o primeiro ano não contava (o projeto era pouco mais que um fraco Lotus). Depois chegou Daniel Ricciardo e o tal plano começaria aí (2019). Ricciardo saiu, Fernando Alonso entrou e o nome mudou para a Alpine, e os franceses insistiram que queriam ser tratados como nova equipa e novo projeto de 5 anos (em 2021).
Agora, com a saída de Alonso, a conversa parece ter feito um novo reset. Contas feitas, a Alpine está no 8º ano de projeto como equipa de fábrica, mas a insistir que é uma jovem equipa promissora.
As trapalhadas com a situação contratual de Oscar Piastri, de facto, pareceram de novatos. Sabe-se lá como, Otmar Szafnauer conseguiu manter o seu posto na liderança da equipa. Nem tudo foi um desastre na verdade: o 4º lugar à frente da McLaren nunca pareceu excessivamente em perigo e Pierre Gasly é um ótimo prémio de consolação para substituir Alonso (com Esteban Ocon no outro lado da garagem). Até os abandonos de 2022 têm um ponto positivo, dado que as restrições de alterações à unidade de potência não se aplicam a motivos de fiabilidade.
2023 tem que ser o ano em que a mais fraca das equipas de fábrica consegue bem melhor do que fazer apenas um terço dos pontos da Mercedes. Os testes não conseguiram revelar quase nada. O carro esteve sempre entre os mais lentos das sessões, ainda que se acredite que terão sido das equipas que mais escondeu o jogo.
Os britânicos
Duas das maiores construtoras britânicas, mas que na F1 compram os seus motores à Mercedes, têm um problema muito semelhante: a estagnação dos seus resultados e como invertê-la.
As escalas são diferentes, claro. A McLaren terminou em 3º lugar m 2020, 4º em 2021 e 5º em 2022. O único pódio fora das 3 primeiras equipas até pertenceu aos britânicos, mas a tendência decrescente é difícil de disputar. Pelo segundo ano seguido, queixam-se de o projeto inicial ainda não estar bem ao gosto da estrutura, uma falha que já tem solução à vista para o próximo ano, quando o túnel de vento novo estará finalmente em ação.
O facto de Zak Brown já ter vindo a púlico referir que o MCL60 está abaixo dos indicadores de performance desejados pela própria equipa parecem indicar que será um início de ano doloroso para Woking. Uma situação que deverá frustrar Lando Norris e aliviar Oscar Piastri (ao colocar menos pressão por cima dos seus ombros).
Já a Aston Martin começou 2022 com um ritmo absolutamente catastrófico, mas ganhou muitos pontos de consideração da parte dos rivais pela maneira como a equipa técnica de Dan Fallows soube encurtar a distância para os lugares pontuáveis em tão curto espaço de tempo. A verdade é que já foram 2 dos 5 anos da estreia dos britânicos, e dois 7º lugares em 10 equipas são o saldo da estrutura. O facto de esta queda ocorrer com Lance Stroll blindado a um dos monolugares não tem passado despercebido.
Mas a verdade é que o lado da garagem de onde se espera o melhor em pista é no de Fernando Alonso, que provocou o caos na Alpine para fazer uma derradeira e arriscada manobra de bastidores, em busca do seu 3º título mundial. A gestão emocional do piloto dará grandes dores de cabeça à equipa, mas a boa forma contínua dele será uma boa compensação.
Sem ninguém contar com isso, a Aston foi um dos grandes destaques dos testes. Isto tanto pelo facto de Felipe Drugovich ter tido que substituir Lance Stroll (lesão), como pelo facto de o AMR23 ter mostrado um ritmo muito interessante, que até leva alguns analistas a considerá-los ao nível dos Mercedes.
Quem nada tem a perder
Com uma temporada bem difícil para a pequena estrutura italiana, a AlphaTauri saiu bem feliz dos 3 dias de testes. Sem a grande referência de Gasly, caberá ao conjunto de Yuki Tsunoda e Nyck de Vries conseguirem fazer uso de um AT04 mais competitivo e que terminou o seu tempo no Bahrain como o que mais quilómetros acumulou. Isto numa altura em que a Red Bull tem estado a ponderar vender a equipa ou relocalizá-la.
Tsunoda e de Vries terão boas oportunidades para mostrar serviço em 2023, oportunidades essas que precisarão de concretizar de modo a afastarem a ameaça da intromissão da enorme quantidade de jovens Red Bull que desponta na F2.
Quem não tem quase nada a provar é a dupla da Haas. Nico Hülkenberg e Kevin Magnussen já abandonaram a categoria antes e não estarão excessivamente preocupados em voltar a fazê-lo se a equipa americana lhes criar problemas. Como dupla competente que aparenta ser vista de fora, esta estará sempre dependente do nível de desenvolvimento ao longo do ano que o VF-23 será capaz de demonstrar.
A outra cliente Ferrari, a Alfa Romeo, está num momento de transição bem curioso: a Alfa em si abandonará no final do ano e não possui nenhum poder de decisão, para passar posteriormente a controlo Audi. Isto significa que Valtteri Bottas e Guanyu Zhou terão que mostrar serviço de forma bem evidente para provar ao novo chefe, Andreas Seidl, que merecem continuar ao volante quando os manda-chuvas passarem para o lado alemão.
As boas notícias são que a performance do mais recente produto de Hinwill chegou a liderar um dos dias de testes (com várias condicionantes, claro) e que pareceu disposta a permitir aos seus pilotos puxar por ele.
Isto deixa apenas a Williams, que despediu a sua chefia nos meses iniciais deste ano depois de ter voltado a terminar em última no campeonato, tendo agora de se ver que género de chefia será a de James Vowles (chegado da Mercedes), que conta com um competente Alexander Albon e uma incógnita ligeira Logan Sargeant (que terá que provar que a antiga chefia acertou em algo, com a sua escolha).
F2 – Pourchaire permanece, mas não terá vida fácil
2023 chega para a Fórmula 2 com um piloto que tem mais do que o favoritismo, tem também a obrigação de ser campeão. Théo Pourchaire foi capaz de ótimas performances em 2022 mas foi errático em diversos momentos e terminou num vice-campeonato manifestamente insuficiente para obter um assento de F1 na Alfa Romeo. A decisão de mais uma temporada de F2 poderá ser arriscada, até se se vir batido por um estreante à semelhança de Robert Shwartzmann em 2021.
Ao lado de Pourchaire está o campeão de F3 de 2022, Victor Martins, o que confere à ART possivelmente a melhor dupla da grelha deste ano.
Ainda assim, existe espaço para surpresas nas restantes estruturas. Hitech e Carlin apostam em duplas inteiramente pertencentes à Red Bull (que está representada por uns estonteantes 6 pilotos na F2), que poderão estar em grande nível (com especial destaque para um Isack Hadjar deserto de poder vingar o título de F3 perdido).
Apesar de apenas se ter estreado em 2022 apenas, a Van Amersfoort surpreendeu durante os testes deste ano com Richard Verschoor a liderar a tabela de tempos. Já a contratação, mais sentimental que racional, de Juan Manuel Correa poderá não trazer os frutos esperados. Já a permanência do bem-cotado Jack Doohan na Virtuosi percebe-se por um lado, ainda que provavelmente seja demasiado piloto para a estrutura em que está (e definitivamente muito mais do que o novo colega Amaury Cordeel conseguirá lidar…).
F3 – Testes deixam Saucy como favorito
Com a tradicional saída de mais de metade da grelha ao final do ano (quer para F2 ou para a obscuridade), a Fórmula 3 mais uma vez contou com a renovação das suas fileiras com alguns dos mais promissores jovens talentos das categorias de base. Falamos de pilotos cujas performances deverão impressionar, como Dino Beganovic da academia Ferrari, Nikola Tsolov da academia Alpine ou Sebastián Montoya da academia Red Bull.
Mas não se pense que o “perigo” não poderá vir dos pilotos que andam no seu segundo ano de categoria. Grégoire Saucy que o diga, tendo dominado os testes de pré-temporada de Fevereiro no seu ART, depois de um falso arranque na temporada de 2022. Franco Colapinto, que melhorou da estreante Van Amersfoort para a competente MP, também terá uma palavra a dizer agora que integra a academia Williams (tal como Zak O’Sullivan).
Para pilotos nas equipas do fundo da grelha, o objetivo é simples: mostrar serviço para que as Prema e Trident da vida os contratem para 2024. Neste quesito vale a pena manter a atenção em homens como Roberto Faria, Oliver Gray ou Taylor Barnard.