Porsche com [quase] vitória dupla – ePrix Misano 2024

14 04 2024

Depois de um acidente em cadeia na prova do ano anterior e de críticas de anos recentes, a Fórmula E viu-se mesmo colocada na posição de ter que deixar cair uma das suas provas mais populares em Roma. Enquanto os organizadores tentam descobrir uma alternativa em território romano, a categoria optou por não perder a ligação a Itália e organizou em conjunto com o circuito de Misano um ePrix alternativo.

Palco habitual do GP de San Marino do MotoGP, Misano dificilmente recolheu grande entusiasmo ao ser anunciado. Território extremamente plano, traçado sinuoso e descrito como não particularmente inspirador de conduzir, o circuito ainda tinha a desvantagem de ser uma adição de circuito permanente a uma categoria que pretendia definir-se como casa de circuitos citadinos.

Fundado em 1972, foram as motas que desde cedo deram proeminência a Misano e que o forçaram a realizar alterações quando foi alongado para cumprir a distância mínima obrigatória do mundial de motas (1993). Pequenas modificações adicionais foram sendo realizadas durante os anos seguintes, desde melhorias dos complexos de boxes até apertar a segunda curva.

Ronda 6 – ePrix de Misano (1) 2024

Com um vencedor diferente em cada uma das provas iniciais, havia a expectativa de saber, a continuar a tendência, quem seria o “estreante” seguinte para a lista.

Mitch Evans (Jaguar) bateu Jean-Éric Vergne (DS Penske) na final de qualificação, com a surpresa principal a ser a intrusão do ABT de Nico Müller nas meias-finais. António Félix da Costa (Porsche) em 13º e Jake Dennis (Andretti) em 18º foram os pilotos do pelotão da frente mais deslocados, e que teriam enormes provas pela frente.

Desde o primeiro momento que Misano provou ser uma prova de caos completo, até mesmo pelos padrões da Fórmula E. Uma pista mais larga que o usual e a tentação dos vários pilotos em segurar posição para não liderar significaram que a mobilidade de posições era de uma enormidade gritante. Oliver Rowland (Nissan) provou isto ao navegar quase livremente entre 12º e 1º ao longo da corrida.

O contacto entre pilotos, até por padrões FE, foi elevado, com Vergne a terminar a sua prova em 7º com uma asa dianteira torta e um dos apêndices traseiros em falta. E houve outros pilotos que terminaram a sua prova mais cedo com o mesmo problema (como Nick Cassidy da Jaguar).

No geral, os líderes sucederam-se mas os grandes destaques foram Félix da Costa, Rowland e Dennis. Os três, juntamente com Vergne, começaram a escapar-se ao pelotão de trás até que Vergne serviu de tampão a Dennis nas voltas finais e Félix da Costa começou a gastar a energia extra armazenada que tinha para segurar o ataque final de Rowland. Um emocionado português festejou efusivamente, naquilo que foi um relançar do seu campeonato. Ou seria, não tivesse sido desclassificado várias horas após o fim da corrida e quando a própria categoria já tinha igualmente efusivamente partilhado fotos do piloto a festejar…

A causa foi uma peça do acelerador de Félix da Costa não estar em conformidade com os regulamentos e promoveu Rowland à sua primeira vitória do ano com a Nissan. Dan Ticktum brilhou com o seu ERT (quando tinha começado 16º), acabando logo atrás de Maximilian Günther (Maserati). Melhor sorte que Sette Câmara que foi penalizado em 50 segundos por consumo excessivo.

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Qualificação: 1. Evans \ 2. Vergne \ 3. Wehrlein \ 4. Müller \ 5. Rowland (Ver melhores momentos)

Resultado: 1. Rowland \ 2. Dennis \ 3. Günther \ 4. Ticktum \ 5. Evans \ 6. Vergne \ 7. Nato \ 8. Vandoorne \ 9. Fenestraz \ 10. di Grassi (Ver melhores momentos)

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Ronda 7 – ePrix de Misano (2) 2024

Ainda de ressaca da eliminação da prova anterior e com a Porsche a defender o seu piloto da desclassificação, a marca alemã chegou ao domingo desertinha de vingar-se da derrota na secretaria que lhe fora imposta. Mas para isto não pôde contar com Félix da Costa, que viu a sua melhor tentativa de qualificação ser eliminada, partindo de último, recuperando até 11º, e acabando por perder a asa da frente na confusão e terminando em último…

Assim, coube a Wehrlein representar a marca de Estugarda numa luta pela vitória que novamente se quedou principalmente com o Andretti de Dennis, com participação especial do Jaguar de Cassidy. Wehrlein segurou os rivais para vencer em Misano, enquanto que Rowland (que andou nos lugares da frente novamente) se viu sem energia na penúltima volta e abdicou da possibilidade de sair líder destacado de Itália.

Assim, quem conseguiu terminar em 4º lugar foi Nico Müller, que ao contrário de no sábado conseguiu segurar rivais com equipamento consideravelmente melhor para dar pontos preciosos à ABT. Sacha Fenestraz desta vez conseguiu estar uns furos mais próximo do ritmo do seu líder de equipa Nissan (Rowland), seguido de perto de Sérgio Sette Câmara que completou um fim-de-semana positivo para a ERT.

A McLaren voltou a provar que simplesmente não tem ritmo de corrida comparável ao seu de qualificação, com destaque para o facto de Jake Hughes ter caído de pole até 8º lugar, seguido de um Jehan Daruvala a pontuar pela primeira vez este ano e do colega de equipa Sam Bird.

O campeonato permanece mais interessante que nunca, ainda que dificilmente a reputação da categoria tenha evitado um golpe depois de mais uma desclassificação de um piloto vitorioso por motivos supérfluos.

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Qualificação: 1. Hughes \ 2. Vergne \ 3. Wehrlein \ 4. Müller \ 5. Bird (Ver melhores momentos)

Resultado: 1. Wehrlein \ 2. Dennis \ 3. Cassidy \ 4. Müller \ 5. Fenestraz \ 6. Sette Câmara \ 7. Vergne \ 8. Hughes \ 9. Daruvala \ 10. Bird (Ver melhores momentos)

Campeonato: 1. Wehrlein (89) \ 2. Dennis (89) \ 3. Rowland (80) \ 4. Cassidy (76) \ 5. Günther (63) —– 1. Jaguar (128) \ 2. Andretti (112) \ 3. Porsche (109) \ 4. Nissan (100) \ 5. DS Penske (75)

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Corrida anterior: ePrix Tóquio 2024
Corrida seguinte: ePrix Mónaco 2024





Maserati atira-se à luta pelo título – ePrix Tóquio 2024

30 03 2024

O sonho dos organizadores da Fórmula E para um ePrix japonês na capital são antigos, tão antigos quanto a própria categoria. O tradicional conservadorismo japonês relativo a inovações, a preocupação com perturbar o trânsito no país, a ambivalência da Câmara da cidade, tudo levou a avanços e recuos permanentes nas negociações para a criação da prova.

Mas 2024, com a ajuda de já ter visto em ação a categoria em locais como Jakarta, Tóquio faz a sua primeira aparição na FE. A pista será centrado no Centro de Exibições Internacional de Tóquio e fará também uso de estradas regulares, numa clara inspiração pela estratégia já utilizada por Londres na sua própria prova.

A verdadeira atração principal será a proximidade do centro de uma das mais famosas cidades do mundo, que também trará uma prova caseira para a Nissan na categoria (que anunciou alguns dias antes, o seu comprometimento com continuar na categoria para além desta geração).

ABT e Porsche viram as suas negociações não chegarem a bom porto, enquanto que a Lola e Yamaha já anunciaram a sua aliança para uma estreia na Fórmula E em 2025.

Ronda 5 – ePrix de Tóquio 2024

Desde o princípio do fim-de-semana que dava para ver que a Maserati tinha em Maximilian Günther um sério candidato a obter pela primeira vez a vitória em 2024. O alemão tinha feito o seu caminho em qualificação, liderando o seu grupo e depois encaminhando-se até à final. O duelo com o Nissan da casa de Oliver Rowland foi uma competição incrivelmente renhida, que terminou com 24 milésimas de segundo de vantagem sobre Günther.

Um contratempo piorado por uma partida mais fraca para a corrida, em que Edoardo Mortara (Mahindra) conseguiu ultrapassá-lo. Com um ritmo forte no seu Maserati, Günther teve uma prova de paciência pela frente, acabando por conseguir em diferentes momentos ultrapassar primeiro Mortara e depois Rowland para vencer o primeiro ePrix de Tóquio.

Rowland dificilmente terá ficado demasiado preocupado. Regressado à Nissan este ano, o britânico acumula dois pódios consecutivos que o deixam a apenas 9 pontos do novo líder do campeonato (Pascal Wehrlein da Porsche) e ajudam a Nissan a subir a 4ª no campeonato de equipas.

Wehrlein, vencedor da primeira prova do ano, tem conseguido pontuar em todas as restantes provas, parecendo estar a adotar uma estratégia de consistência que o viu terminar em 5º e recuperar a liderança do campeonato. O colega, António Félix da Costa, passou a prova dele bem próximo e até ameaçou conseguir um pódio, só que não escolheu o melhor momento de atacar Rowland, sendo novamente passado por Jake Dennis (Andretti), sendo 4º no final.

Norman Nato (Andretti) terminou 6º, enquanto que a segunda linha da grelha (Mortara e Sergio Sette Câmara [ERT]) teve vida bem mais difícil na corrida. Mortara não viu a bandeira de xadrez, enquanto que Sette Câmara viu a falta de ritmo da ERT explorada a fundo pelos rivais (mas conseguindo ainda segurar o último ponto).

Nick Cassidy (Jaguar) acabou por minimizar os estragos de uma qualificação em 19º ao chegar em 8º, especialmente importante dado o abandono do colega Mitch Evans que perdeu a frente quando arriscou em demasia numa manobra de ultrapassagem. Destaque ainda para a forma como Nico Müller se qualificou e classificou em 7º, permitindo à ABT abrir a conta do ano (antes mesmo da fornecedora de propulsores, a Mahindra).

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Qualificação: 1. Rownlad \ 2. Günther \ 3. Mortara \ 4. Sette Câmara \ 5. Dennis (Ver melhores momentos)

Resultado: 1. Günther \ 2. Rowland \ 3. Dennis \ 4. Félix da Costa \ 5. Wehrlein \ 6. Nato \ 7. Müller \ 8. Cassidy \ 9. Frijns \ 10. Sette Câmara (Ver melhores momentos)

Campeonato: 1. Wehrlein (63) \ 2. Cassidy (61) \ 3. Rowland (54) \ 4. Dennis (53) \ 5. Günther (48) —– 1. Jaguar (100) \ 2. Porsche (83) \ 3. Andretti (70) \ 4. Nissan (62) \ 5. DS Penske (57)

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Corrida anterior: ePrix São Paulo 2024
Corrida seguinte: ePrix Misano 2024

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Fontes:
FE \ Nissan junta-se à Gen 4
Grande Prêmio \ Porsche e ABT não se entendem
Motorsport BR \ Lola e Yamaha juntam-se em 2025
Racing Circuits \ Tóquio





O décimo round da Fórmula E

7 01 2024

A décima temporada da história da Fórmula E começa dentro de uma semana e é seguro dizer que desde a primeira temporada que não se questionava de forma tão aberta o caminho que a categoria tem vindo a seguir.

A remoção de Roma do calendário por troca com um circuito permanente como Misano foi comunicada como uma ótima novidade, mas recebida com consternação. Sendo normal haverem substituições temporárias nas pistas, não escapou a ninguém que Portland está a começar a ter um ar permanente quando deveria ser um mero substituto provisório de Nova Iorque. Cidade do Cabo, Hiderabade e Jakarta caíram do ano passado para este. A China, palco da primeira corrida da categoria, está de regresso no circuito permanente de Shanghai.

Algumas das estruturas já fizeram saber que não apreciam que das 10 localizações do próximo ano tenhamos 4 em circuitos regulares em vez de citadinos. Quando a FE se tem conseguido destacar positivamente pela presença massiva de construtoras automóveis (depois do susto da saída de Audi e Mercedes), fariam bem em perceber as queixas. Dois dias de testes de pré-temporada interrompidos por um estranho incêndio de garagem também causaram estranheza.

Nem tudo são más notícias. O título mundial de Jake Dennis foi popular dentro do paddock e conseguido apenas na última ronda dupla, por uma equipa privada, reanimando os ânimos de que é possível a quase qualquer estrutura (com o orçamento e capacidade técnica certos, claro) conseguir ser bem-sucedida na categoria elétrica.

E corridas de pelotão à parte, houve momentos altos da ação em pista dos novos Fórmula E de 3ª geração em 2023. O segundo ano promete mais.

Que vida para os protagonistas de 2023?

Se haviam dúvidas sobre como Porsche e Jaguar lidariam com verem as suas clientes (Andretti e Envision, respetivamente) baterem-nas, a resposta parece ter sido simples: consolidação. A Porsche manteve a sua dupla de Pascal Wehrlein e António Félix da Costa, tentando saber manter o ritmo de desenvolvimento do seu motor elétrico. A Jaguar segurou Mitch Evans e foi “roubar” Nick Cassidy à sua cliente, procurando ter dois pilotos fortes no seu seio.

A julgar pelos testes, em que ficaram com o Top 3 da classificação em Valência, promete dar certo a sua aposta. Para Andretti e Envision, trata-se agora de uma questão de conseguir não perder o “comboio” que têm vindo a utilizar desde o início do ano passado (e até um pouco antes).

A Andretti tem como trunfo o campeão em título (Jake Dennis) e foi buscar Norman Nato à Nissan, de forma substituir o errático André Lotterer. Nos testes a aclimatização não foi inteiramente ideal, com um 9º e 12º lugares. Já a Envision perdeu o seu melhor trunfo, mas manteve um rejuvenescido Sébastien Buemi e foi buscar um ex-piloto sob a forma de Robin Frijns. Ambos colocaram-se no Top 10 de Valência.

O meio da tabela

Atrás destas 4 equipas ficaram duas estruturas do grupo Stellantis, que apostam em continuidade. A DS teve um primeiro ano moderadamente positivio com a Penske e a dupla de campeões manter-se-á em 2024 (Jean-Éric Vergne e Stoffel Vandoorne) à espera de melhores oportunidades.

Já a colega Maserati, também em primeira ano de parceria (com a Venturi) teve que proceder a alterações inesperadas. Edoardo Mortara, de pedra e cal há vários anos, teve que sair por uma completa incapacidade em obter resultados relevantes (será substituído pelo estreante Jehan Daruvala) e Maximilian Günther apanhou todo o paddock de surpresa com um brilhante ano (recompensado pela sua manutenção).

Os testes foram inconclusivos para ambas.

Já a Nissan e a sua cliente McLaren chegam com ambições mistas para 2024. A Nissan fez uma cópia da Envision, por assim dizer: perdeu o seu piloto principal (Nato) e segurou a prata da casa (Sacha Fenestraz), indo buscar um ex-piloto da sua casa que já viu melhores dias (Oliver Rowland, que regressa amassado da sua experiência na Mahindra).

A McLaren, a usar motores dos japoneses, até tinha começado bem 2023 (ou não fosse a “reencarnação” da estrutura oficial da Mercedes) mas foi perdendo ritmo ao longo do ano. Começar bem 2024 é prioritário, sendo por isso que foram buscar um experiente Sam Bird para acompanhar um Jake Hughes que fez boa figura na sua estreia de laranja no ano passado.

Rowland foi o único a conseguir colocar-se no Top 10 nos testes, mas os sinais não foram maus.

Quem precisa de reformular tudo

Assim, sobra quem teve anos terríveis em 2023. Ou, pelo menos, continuações de períodos de performances pouco impressionantes.

A grande derrotada foi mesmo a Mahindra, que percebeu que seriam necessárias alterações enormes. A primeira preocupação é garantir que não volta a suceder nada com a gravidade da falha do sistema de suspensão da Cidade do Cabo, ainda que as regras de homologação de monolugar lhes possa dificultar a vida. Não foi por acaso que perderam ambos os pilotos, com Lucas di Grassi a terminar o seu contrato antes de tempo.

Para 2024 apostaram numa dupla de pilotos que ao longo do último ano deixaram bastante a desejar em 2023 mas que quer voltar a mostrar serviço: Edoardo Mortara, que se perdeu na Maserati, e Nyck de Vries, que nunca se encontrou na F1 com a AlphaTauri. O talento dos dois é mais que suficiente, no entanto resta ver como se recuperam. O Top 10 nos testes de Mortara é um sinal positivo.

Já a ABT deve estar arrependido de se ter “atrelado” à Mahindra no seu regresso à FE, contudo manteve os préstimos de Nico Müller e foi buscar o experiente campeão Lucas di Grassi para relançar-se com novo fôlego para 2024.

A NIO, que passou a ERT, manteve a sua dupla (Dan Ticktum e Sérgio Sette Câmara) e procurará fazer de um 2023 em que voltou a pontuar com mais frequência uma base para almejar regressar a uma posição mais forte em 2024.