Sébastien Ogier em 2013 – Flash

15 01 2022

No início da década de 10 do século XXI um piloto decidiu dar um salto para o desconhecido e largar uma estrutura à qual devia em grande parte o início da sua carreira. Para fãs de Fórmula 1 esta descrição soa muito familiar, mas não é uma referência a Lewis Hamilton que aqui é feita e sim a de outro multi-campeão do mundo: Sébastien Ogier no mundial de rális.

Brevemente colega de equipa tanto de Kimi Räikkönen e de Sébastien Loeb nos seus primeiros anos no WRC, Ogier rapidamente sentiu ter chegado a um tecto no seu desenvolvimento como piloto. As escolhas a fazer poderiam ter parecido limitadas a alguém que se encontrava no seu primeiro ano na dominante equipa oficial da Citröen, mas Ogier optou por dar um salto rumo ao desconhecido.

As escolhas do piloto francês, atualmente uma lenda viva do seu desporto, acabariam por moldar grande parte da década da sua categoria de automobilismo, ascendendo além do que muitos esperariam e sabendo provar que era muito mais do que um fruto do equipamento à sua disposição quando a Volkswagen foi abalada pelo escândalo dos motores diesel e começou a retirar-se de competição.

No último ano em que Ogier faz uma temporada completa de competição, vejamos então o seu percurso ao longo dos anos.

Ao serviço da Citroën e o embate com o outro Sébastien

Com um pai fã de Ayrton Senna e um tio que fora piloto de autocross, era essencialmente impossível que Sébastien Ogier não se envolvesse no mundo do automobilismo. Após um período a conduzir karts, começou a competir em campeonatos de rally até triunfar num organizado pela Federação Francesa de Automobilismo em 2005 (o Rallye Jeunes), que lhe assegurou um lugar no Troféu Peugeot 206 (onde conheceu o seu co-piloto de todos rallys de WRC, Julien Ingrassia). No primeiro ano foi o melhor estreante e no seguinte (2007) foi campeão com 4 vitórias.

Esta presença no universo do grupo PSA valeu-lhe um lugar no Citroën C2 no JWRC (Junior WRC), a acompanhar as corridas do campeonato mundial da categoria principal. No Rally do México 2008 venceu na classe e tornou-se o primeiro piloto de JWRC a pontuar no WRC, tal fora o seu ritmo ao longo da prova. Na Jordânia nem uma avaria, que lhe custou 4 minutos parado, o impediu de vencer. Um 2º lugar na prova de casa assegurou-lhe o título mundial e mais uma prenda: o primeiro WRC com um Citroën C4 em que ganhou a primeira etapa no gelo no Rally de Gales.

A Citroën estava interessada nos serviços do francês para a sua segunda equipa na primeira metade do ano, com a segunda a depender dos seus resultados. Ogier assegurou a segunda metade do ano em que obteve o primeiro pódio WRC no Rally da Acrópole, para além de ter conseguido vencer uma prova de IRC do Rally Monte-Carlo no início do ano com um Peugeot. A renovação para 2010 era claramente merecida.

Nesse ano crucial (e após mais uma impressionante performance no Mónaco no IRC), Ogier contaria com a companhia do campeão do mundo de F1 Kimi Räikkönen no outro lugar da equipa. Ao mesmo tempo, na equipa principal da marca, Sébastien Loeb campeão de WRC desde 2004 estava numa das fases dominantes da sua carreira.

Ogier foi consistência personificada nessa temporada. No segundo rally chegou o segundo pódio da carreira no México após um duelo com o experiente Petter Solberg, e depois esteve pertíssimo da primeira vitória na Nova Zelândia mas saiu de pista a três curvas do fim e perdeu para o Ford de Jari-Matti Latvala por 2,4 segundos. Não precisou de esperar muito: na corrida seguinte triunfou no Rally de Portugal sobre Sébastien Loeb.

Com o segundo piloto da equipa principal, Dani Sordo, a deixar muito a desejar, Ogier foi promovido por uma corrida a esta por troca com Sordo. Ficou em 2º lugar na frente de Loeb. Na vez seguinte em que esteve no Citroën ao lado de Loeb, Ogier triunfou no Rally do Japão contra Solberg. Tendo chegado a estar na disputa do título com 3 provas em falta, o francês fizera mais do que o suficiente para conquistar um lugar permanente na equipa principal.

Com a promessa de tratamento igual, Ogier encaminhava-se ainda assim para uma estrutura na qual Loeb era líder incontestado. A seu favor havia o novo carro, o DS3, ao qual ambos precisariam de se habituar. A primeira vitória coube a Loeb, depois de Ogier sair de pista enquanto liderava. Mas o Sébastien mais novo venceu as duas seguintes em Portugal e na Jordânia. E depois o mais velho deu o troco na Itália e Argentina. Em luta pelo título, os dois pilotos começaram a ter episódios de tensão, como quando Ogier forçou Loeb a “abrir” a estrada na Grécia ou quando na Alemanha Ogier se recusou a ficar em 2º por ordens de equipa e venceu, acusando depois a equipa de desrespeito.

Um problema de motor e um acidente deixaram-no a zeros nas duas rondas finais e afastaram-no de uma luta pelo título contra Loeb e o Ford de Mikko Hirvonen. Com Loeb de contrato assinado para mais anos e a Citroën insatisfeita com o ritmo dos bastidores, Ogier e a marca terminaram o seu longo relacionamento. Alguns dias depois, Ogier anunciou que chegara a acordo com a Volkswagen de 2012 em diante.

2013

O grupo Volkswagen estava à algum tempo interessado na entrada na principal categoria de rallys, tendo esperado o momento de alteração das regras que permitissem desenvolver o Polo e em que tivesse o piloto ideal. O momento chegara.

A preparação para a estreia começou num 2012 em que Ogier intercalou entre numerosas sessões de testes com o Volkswagen Polo WRC e a participação na temporada de WRC com um pouco competitivo Škoda Fabia S2000. Ainda assim, o piloto estava com frequência à frente dos rivais de S2000, a ponto de o seu 5º lugar no Rally de Itália ser o melhor de sempre de um S2000 na classificação geral.

Em 2013 o Polo fez a sua estreia. Se haviam preocupações em relação ao nível na primeira corrida no Mónaco, estas desapareceram de imediato. Ogier lutou contra Loeb pela vitória e chegou em 2º. O VW brilhava nas mãos do piloto francês, acompanhado na equipa por Latvala.

A verdadeira prova dos nove viria no Rally seguinte. No frio da Suécia, Ogier tomou uma brilhante vitória, a primeira para a Volkswagen, tornando-se apenas o segundo vencedor a vir de fora dos países nórdicos. Na prova seguinte do México novo triunfo, com 16 das 23 etapas vencidas. Depois chegou Portugal e a margem de vitória foi de 3 minutos sobre o seu substituto na Citroën, Hirvonen. Para ajudar, o campeão Loeb estava apenas em part time na temporada de 2013 após anunciar a sua reforma de tempo inteiro em 2012.

A ausência de um rival estabelecido seria um trunfo para Ogier ao longo do ano. O colega de equipa Latvala também conseguiria contribuir com um triunfo no Rally da Acrópole. Mas daí em diante foram 6 Rallys vencidos em 7 possíveis, e um título mundial conquistado na primeira etapa do Rally de França quando faltavam ainda duas provas adicionais para o fim do ano.

Pelo meio houve espaço para um brilharete na Alemanha, quando subiu de 47º para 17º depois de ter tido uma suspensão partida, e um palmarés de 9 vitórias, 11 pódios e quase 50% das etapas do ano vencidas para acumular o maior número de pontos de sempre da história do WRC e entregar à Volkswagen o primeiro título de equipas, acabando com a hegemonia Citroën.

Performances para além do carro

Os anos seguintes seriam sinónimos com domínio do novo Sébastien na categoria principal de Rallys. Um segundo bastante similar ao primeiro tornou-o um bicampeão mundial e valeu-lhe uma renovação de contrato. Hyundai bem dava os seus primeiros passos, mas os habituais adversários (Citroën e Ford) pareciam simplesmente não ter argumentos para responder. O vice-campeão em 2014 foi justamente o colega Latvala…

2015 e 2016 voltariam a ser títulos de Ogier por alguma margem, ainda que em 2016 o vice-campeão já fosse de outra marca, com Thierry Neuville da Hyundai a segui-lo. Com 4 títulos consecutivos e um escândalo sobre as emissões dos seus carros a gasóleo a agastá-la, a Volkswagen decidiu abandonar no ano seguinte o mundial. Após anos de domínio, muitos aguardavam a possibilidade de ver Ogier a debater-se com dificuldades quando deixasse de ter o poderoso VW debaixo de si.

O francês assinou contrato com a M-Sport, preparadora oficial dos Ford, e guiou pela marca americana em 2017. Na primeira corrida ao serviço da Ford, Ogier acabou com o jejum de vitórias vindo de 2012 da equipa, triunfando no Rally Monte-Carlo. Mas não seria um ano de facilidades. A Toyota juntara-se à contenda e a Hyundai estava mais forte que nunca. Apenas 2 vitórias viriam nesse ano mas Ogier soube acumular uma enormidade de pódios, valiosos perante a ameaça do Hyundai de Neuville (com 4 triunfos). No final, foi mais um título para Ogier seguido de Neuville e do colega de equipa Ott Tänak e a prova de que não importava o carro para o francês dominar a concorrência.

No ano seguinte os mesmos rivais (agora com Tänak na Toyota) provariam ser ossos duros de roer mas o título voltou a não escapar (o 6º consecutivo). A Citroën entretanto tornara-se uma equipa um pouco perdida no pelotão e Ogier decidiu regressar à sua primeira equipa para a regressar aos lugares de topo. Foram 3 vitórias e 8 pódios, um dos melhores registos recentes dos franceses, mas pela primeira vez desde 2003 um Sébastien não terminaria em 1º o campeonato. Neuville e Tänak acabaram na frente de Ogier, com o último a tornar-se campeão do mundo.

No final desse ano o piloto anunciou que trocaria a Citroën pela campeã Toyota no final do ano (Tänak foi para a Hyundai) um ano antes do contrato terminar e mostrando-se pouco impressionado com o desenvolvimento de carro e comunicação interna da equipa. Por seu turno, a Citroën anunciou que abandonaria o WRC e atirou as culpas disso com o abandono repentino de Ogier (se bem que pareceu que os franceses estavam à procurar de desculpas para a saída).

A natureza fragmentada de 2020 atingiu com particular severidade o WRC, reduzindo o calendário que normalmente tinha 14 corridas para apenas 7. Isto significava que não seria possível ter demasiados erros, uma vez que as oportunidades de redenção eram diminutas. Com 5 pódios e 2 vitórias, Ogier, mais uma vez, sagrou-se campeão do mundo na frente do novo colega de equipa Elfyn Evans e do Toyota de Tänak.

Com o anúncio de que 2021 seria o seu último ano a fazer temporadas inteiras, os rivais de Ogier tinham uma derradeira oportunidade para o derrotar. Com um conjunto de Rallys mais bem composto, Ogier voltou a ter que se digladiar com o colega Evans. Num ano em que ambos estiveram num excelente nível, chegaram ao Rally de Monza (última prova do ano) com hipóteses de título e foi justamente entre ambos que ficou a luta pela vitória. No final ficou Ogier na frente por 7,3 segundos, ajudando-o a somar o 8º e, aparentemente, útlimo título mundial.

Legado

É difícil saber exprimir o que o mundial de Rallys perderá com a saída de um talento da dimensão de Sébastien Ogier. Foi com os títulos do piloto que a França ultrapassou a Finlândia como país com mais títulos de piloto na história do WRC, (18) quando em 2004 estava a conquistar o seu segundo… É igualmente difícil separar os “Sébastiens”, como o fim do reinado de um deu origem ao do outro. Entre 2004 e 2021, só o título de 2019 lhes escapou.

Ogier sai categoria principal com 8 títulos mundiais e 54 Rallys vencidos (2º atrás de Loeb em ambos os quesitos). Tornou-se recordista conjunto de maior número de títulos por equipas diferentes (empatado com Juha Kankkunen) e para saber quão bom era há poucas imagens de marca tão presentes no automobilismo mundial quanto a do francês a manobrar os seus carros no Rally Monte-Carlo (venceu 7 vezes no WRC e 1 no IRC).

Em 2022 teremos a primeira temporada sem Ogier desde a sua estreia e aguarda-se com expectativa se voltaremos a ter campeões a intercalarem entre si, ou se alguém conseguirá uma nova dinastia. Pilotos com um palmarés já bastante bom como Ott Tänak e Thierry Neuville aguardam a sua vez, enquanto jovens promessas como Elfyn Evans e Kalle Rovanperä mordem-lhes os calcanhares.

Vale recordar que Ogier ainda não parará por completo: fará um programa parcial em que continuará a ser o mesmo osso duro de roer de sempre…

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“Flash” anterior: Lancia em 1956
“Flash” seguinte: Kimi Räikkönen em 2007

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Fontes:
Facebook \ Entrevista Ogier
Hot Cars \ Carreira Ogier
Sébastien Ogier \ Biography
Wikipedia \ Sébastien Ogier





Lancia em 1956 – Flash

8 01 2022

Poucos nomes conseguem a proeza de conjugar em doses tão generosas a excentricidade de não serem grandes construtoras automóveis com o palmarés de numerosas vitórias no automobilismo tão bem quanto a Lancia.

A marca italiana, fundada em 1906 pelo piloto e mecânico Vicenzo Lancia, passou por várias fazes de desenvolvimento ao longo do seu centenário de experiência e, para desapontamento de muitos fãs de automobilismo, tem sido relegada pelo grupo Stellantis a um papel para além de secundário. A sua única tarefa, depois de ter colocado os seus logótipos em Chryslers para vender na Europa durante alguns anos, reside na venda do modelo Ypsilon na Itália.

Nem sempre foi este o estado natural da marca, no entanto. Mesmo décadas e décadas depois, a Lancia continua a ser recordista de títulos mundiais de rális com 10 triunfos no campeonato. Os seus modelos tornaram-se lendários e sinónimos de nostalgia pura (modelos como o Stratos, 037 e Delta).

Menos conhecido, e não reconhecido nos recordes de F1, está o D50 com que Juan Manuel Fangio conquistou o seu 4º título mundial.

De Vicenzo Lancia à aventura cortada a meio na F1

O fundador da Lancia, tal como em vários casos do automobilismo dos anos 50, era um dos carismáticos pilotos / mecânicos que quis experimentar aventurar-se em ser chefe de equipa. Vicenzo Lancia, aprendiz dos irmãos Ceirano (que fundariam a Fiat) e piloto de testes foi quem decidiu fundar a nova construtora automóvel em 1906, mas continuou a correr ao serviço da Fiat.

Após a sua morte, o filho Gianni tomou controlo da marca e no período pós-Segunda Guerra Mundial decidiu que se queria imiscuir no mundo dos Grande Prémios em 1954. Contratando um projetista de renome (Vittorio Jano), a Lancia tinha uma montanha enorme para escalar dado o domínio dos Mercedes W196. Assim começou o projeto D50.

Com um motor posicionado diagonalmente no chassis, o carro evitava a presença de um eixo longitudinal debaixo do assento do piloto (melhorando o comportamento em pista), tinha um motor V8 de 2,5 litros, caixa de velocidades montada na traseira e os líquidos (combustível e óleo) eram mantidos dentro dos eixos de modo a evitar efeitos nocivos na condução à medida que o volume destes diminuía. Tudo isto fabricado com precisão milimétrica e cuidado extremo, a ponto de provocar dívidas enormes à Lancia.

Com os seus 620 kg, que o tornavam um dos mais leves concorrentes, o Lancia D50 foi colocado em pista pela primeira vez no Grande Prémio de Espanha de 1954 e dominou a concorrência nas voltas em que funcionou (9) com Alberto Ascari. Mas 1955 seria o ano para verdadeiramente testar o novo carro com o mencionado Ascari, Luigi Villoresi, Eugenio Castellotti e Louis Chiron. No Mónaco Ascari chegou a liderar depois do abandono do Mercedes de Juan-Manuel Fangio, mas um erro atirou-o para as águas do porto (onde quase se afogou). Nesse ano as únicas vitórias foram mesmo em provas extra-campeonato em Turim e Nápoles (com Ascari).

Mas depois chegou a tragédia. Alberto Ascari perdeu o controlo do Ferrari que estava a testar em Monza e faleceu (com 30 anos de diferença para o pai quando este falecera no GP de França de 1925). Gianni Lancia rapidamente perdia o apetite por continuar na F1.

1956

Com um rol enorme de dívidas, Gianni estava decidido a terminar o seu envolvimento e a Lancia só correu em uma outra prova de 1955 porque Castellotti quis inscrever-se como privado no GP da Bélgica. A solução passou por vender a marca automóvel a Carlo Pesenti da multinacional Italcementi e os D50 a Enzo Ferrari.

A Ferrari pegou nos modelos e desenvolveu-os (se bem que eliminaram algumas das caraterísticas mais incomuns do monolugar), mudando-lhes o nome para Lancia-Ferrari D50 e usou-os na temporada de 1956. Com a saída repentina da Mercedes da F1 no ano anterior (em grande parte pelo desastre de Le Mans de 1955) o campeão do mundo em título, Fangio, estava disponível para ser contratado e assim foi para a Scuderia. A luta pelo título entre a Ferrari e Maserati acabaria por ser também entre os ex-colegas da Mercedes, Fangio e Stirling Moss.

Fangio abandonou a primeira corrida em casa, mas fez uso do carro do colega de equipa Luigi Musso (na época era possível fazer isto e dividir os pontos finais) para triunfar na Argentina. Moss, por outro lado, abandonou e não assumiu o controlo do carro de nenhum colega. Quando o britânico triunfou na corrida seguinte no Mónaco, Fangio voltou a fazer uso da divisão de carro para minimizar os estragos com um 2º lugar.

O D50 triunfaria também pelas mãos do americano britânico Peter Collins nas provas seguintes (GPs da Bélgica e França), com Moss a limitar os estragos o melhor possível com um 3º e 5º lugares. Em terras francesas em particular, os Lancia-Ferrari foram dominantes. Na Inglaterra coube aos BRM liderarem até abandonarem, depois seguiu-se Moss até o mesmo lhe suceder até sobrar Fangio, que triunfou. O argentino acabaria por repetir o lugar mais alto do pódio no Nürburgring com a vantagem de o colega Collins ter abandonado, sem ficar ferido, e estar agora a 8 pontos de distância.

A única maneira de Collins roubar o título a Fangio e Moss seria com uma vitória e uma volta mais rápida. A meio da prova, Fangio abandonara e Collins estava em 2º com boas hipóteses de triunfar. Só que o americano parou e passou o carro a Fangio, magnanimamente. O argentino terminou em 2º e os pontos divididos deram-lhe mais um título mundial, um que sempre agradeceu a Collins. Questionado sobre o porquê de o fazer, Collins disse que teria ainda mais oportunidades de ser campeão. Infelizmente, faleceu no GP da Alemanha de 1958 sem o fazer.

Compra pela Fiat: o bom e o mau

As presenças na Fórmula 1 terminariam por aqui. Em 1957 uma evolução do D50 até foi usada, mas a Ferrari já eliminara o nome Lancia do chassis. Fangio abandonou a equipa, mal impressionado com a preparação do seu carro. Já a marca automóvel perdurou com Carlo Pesenti, destacando-se como produtora de carros tecnologicamente avançados e luxosos (e caros) como o Fulvia, Flavia e Flaminia. Com as vendas em baixo, a empresa quase faliu até ser resgatado pelo grupo Fiat.

A presença da Fiat acabaria por ter duas faces. Por um lado permitiu-lhes financiar o segmento do automobilismo, particularmente o mundial de rallyes. Um a um, a Lancia lançou alguns dos mais icónicos carros da história do WRC. Primeiro veio o belíssimo Stratos, que fora criado com o menor número possível de versões de estrada (apenas as suficientes para cumprir o regulamento) por ter sido feito para triunfar nas mãos de pilotos como Sandro Munari. Depois chegou o 037, com tração às rodas traseiras num mundo em que tinha que competir com o Audi quattro mas capaz de voar nas mãos de homens como Walter Röhrl e Henri Toivonen. Por fim, o Delta com que Toivonen somou triunfos.

Inicialmente, a influência Fiat fez maravilhas às vendas da Lancia. Com acesso a componentes dos “restos” da Fiat, a Lancia produziu o Beta. Este era equipada com bons motores, caixa de 5 velocidades, suspensão independente e discos de travões em todas as rodas, para além de estar a um preço bem mais acessível. O sucesso foi suficiente para que a marca chegasse a ser vendida nos EUA. Mas depois, veio o rude acordar.

Ao contrário de anteriormente, os carros eram mal construídos, com o aço da sua construção a ser o pior de tudo. Era aço soviético, devido a acordos da Fiat, que era mais fino e logo de menor qualidade. Com as chuvas, os carros começavam a enferrujar com imensa facilidade, a ponto de quase se dissolverem. Tendo que gastar milhões a comprar de volta muitos destes carros, a marca teve ainda a desvantagem de ver o seu nome indissociável de má qualidade, a ponto de nunca mais conseguir vender nos EUA e no Reino Unido.

Quando o Grupo Fiat adquiriu parte da General Motors, a Lancia sofreu o seu golpe mais forte: passou a vender apenas modelos de outras marcas com crachás da Lancia (especificamente, o Fiat 500 e vários Chryslers).

Legado

Há poucos nomes na história do automobilismo que consigam espelhar tão bem a mistura de saudosismo produzida pelo nome Lancia. Quando a MAT pegou no chassis de um Ferrari 430 recentemente e lhe modificou o visual de modo a parecer uma reinterpretação moderna do Lancia Stratos, estes venderam rapidamente. Para além de terem fascinado muitos fãs de automobilismo. A conclusão parece óbvia: existe um apetite para um reavivamento da marca.

A grande incógnita é se a marca conseguirá sequer figurar entre o Top 10 de prioridades do grupo Stellantis, dado o enorme portofólio que possuem de momento.

No que toca à participação na Fórmula 1, bem se pode considerar que a Ferrari deveu uma grande parte do seu sucesso ao saudoso Lancia D50. Sem o falecimento de Alberto Ascari, e com uma equipa de gestão mais concentrada em não exceder os seus limites financeiros, quem sabe onde poderia ter chegada a aventura dos italianos nos Grande Prémios dos anos 50…

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“Flash” anterior: Jarno Trulli em 2004

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Fontes:
– HILL, Tim; THOMAS, Gareth. The Encyclopedia of Formula 1. Parragon (2012)
Dyler \ Lancia Beta
ESPN \ Lancia
Josh Revell \ WTF Happened to Lancia?
Revs Institute \ Lancia D50
Wikipedia \ Lancia D50





Top 10 – Fórmula 1 em 2021

26 12 2021

Depois das exibições maiores do que nunca de domínio Mercedes em 2020, a Fórmula 1 teve um bálsamo digno em 2021 com uma luta pelo título que conta entre as mais disputadas da história da categoria e com um desfecho que fez correr os noticiários do mundo inteiro (por bons e maus motivos).

Os talentos de Max Verstappen e Lewis Hamilton trataram de fazer a maior parte do trabalho, numa luta em que esteve a nu o que acontece quando dois pilotos de grande categoria têm que procurar todas as milésimas de segundo que conseguem (e o que acontece quando o parcialismo dos seus fãs passa os limites do aceitável), mas que por si só não explica o grande 2021 vivido pela F1.

O grande trunfo da temporada foi mesmo que atrás dos Red Bull e Mercedes ocorriam lutas com quase tanta importância.

A Ferrari recuperou com uma velocidade que nem os seus maiores fãs teriam previsto, impulsionada por dois excelentes pilotos contra uma McLaren que passou a maior parte do ano com uma mão presa atrás das costas, sob a forma de Daniel Ricciardo. Um dos grandes destaques dos últimos anos, o australiano precisa de mostrar muito mais em 2022, até porque a equipa tem feito um namoro já prolongado com a sua estrela de IndyCar (Patricio O’Ward).

Esteban Ocon esteve bem perto de integrar esta lista, tendo feito uma parceria estranhamente harmoniosa com o regressado Fernando Alonso e garantido a primeira vitória da Alpine na F1 numa prova em que teve que segurar o multi-campeão Sebastian Vettel. Vettel fez um ano de recuperação de imagem, batendo com alguma facilidade um Lance Stroll que brilha cada vez menos, mas faltou-lhe a consistência das suas grandes performances (como Mónaco, Azerbaijão e Hungria).

No fundo da grelha ficou uma Haas a apostar todas (mesmo todas) as suas fichas no futuro VF-22. Uma inesperada e pouco bem-vinda luta fraticida entre Mick Schumacher e Nikita Mazepin era dispensável, assim como uma falta de ritmo preocupante do último (que pareceu crescer durante o ano). A Alfa Romeo corre sérios riscos de poder ser a principal vítima dos novos regulamentos, parecendo-lhe faltar o Norte nas suas decisões estratégicas.

Falta ver se a paciência nos investimentos de longo prazo existirá a nível de infraestruturas na Williams, McLaren e Aston Martin, e a nível de pilotos no que toca à AlphaTauri (que perdeu o 5º posto para a Alpine em grande parte devido a um errático Yuki Tsunoda, que apenas pareceu brilhar na primeira e última provas do ano).

Resta ver que futuro esperará uma categoria em que a paciência com Michael Masi se esgotou no final do ano, em que as corridas sprint estiveram muito longe de receber do público os elogios que os dirigentes da FOM lhe deram, em que falta ver que consequências de longo prazo no relacionamento da Mercedes com a FIA (e o seu novo Presidente, Mohammed Ben Sulayem) existirão e em que os novos regulamentos de 2022 farão com a ordem e proximidade da grelha de partida da Fórmula 1.

1 – Max Verstappen

Recorde de maior número de pódios numa temporada (18) batido, todos eles nos 2 primeiros lugares da grelha com 10 vitórias e 8 2º lugares. Primeiro piloto desde Sebastian Vettel em 2013 a somar mais triunfos que Lewis Hamilton num campeonato. Nas 4 corridas em que não pontuou foi por acidentes provocados por outros (com exceção de Itália). Num deles conseguiu pontuar apesar de ter metade do carro severamente danificado (2 pontos muito valiosos na Hungria).

Os números falam por si e o título mundial foi a justa recompensa.

Ao longo do ano foi comum ouvir que, estando na sua primeira disputa de título e ainda por cima contra um dos melhores da história da categoria, Verstappen teria que começar a cometer erros devido à pressão. Mas não foi o que aconteceu. Sabendo amealhar os 2º lugares sem cometer erros quando Hamilton estava num fim-de-semana melhor, Verstappen também mostrou uma agressividade nata quando um embate o beneficiaria a si. As manobras 50/50 a que submeteu o rival, principalmente no início do ano, valeram-lhe muitos pontos (na partida de Imola, por exemplo).

Num nível de eficiência incrível durante todo o ano, Verstappen ofereceu à Mercedes um nível de pressão com que os alemães lidaram muito mal e deixou o competente Sergio Pérez com quase metade dos seus pontos no mesmo carro. A maneira calma como negociou uma pista cada vez mais molhada em Sochi para ascender ao 2º lugar quando partiu de último impressionou até o mais apático fã de F1.

A caça a Hamilton em Paul Ricard para a vitória, o domínio exibido em Zandvoort, a defesa aguerrida de posição perante os ataques de Hamilton em Austin… Não faltam exemplos de como Verstappen subiu de nível em 2021 para se bater de igual para igual com um hepta-campeão. E saiu por cima.

2 – Lewis Hamilton

Não há muito de errado a apontar a Lewis Hamilton em 2021. No geral, estar abaixo de Verstappen tem mais a ver com a maneira como o adversário não lhe cedeu durante um ano inteiro. Se quisermos apontar defeitos poderia apontar-se para a maneira como não conseguiu uma boa afinação no GP do Mónaco, no famoso botão “magic” que se esqueceu de desligar no GP do Azerbaijão ou num incidente em que eliminou Verstappen no GP do Reino Unido (e onde foi visível o seu lado mais frio).

Mas no geral, são meros pormenores quando se olha para as restantes 19 corridas do ano. O sangue frio para não entrar em pânico na Rússia quando passou uma prova inteira a olhar para a caixa de velocidades de Lando Norris, triunfando pela 100ª vez. A prova de recuperação de última a primeiro ao longo de prova e meia no Brasil, com ultrapassagens e não por mera estratégia. 3 vitórias nas 4 primeiras corridas. E uma consistência de pontuações que o viu falhar os pontos apenas em duas ocasiões.

Hamilton mostrou também o valor da experiência acumulada de vários anos de lutas na frente do campeonato. O inglês tinha sempre um comentário sarcástico a aplicar nos momentos certos, o tom calmo para lançar dúvidas quanto à legalidade do carro adversário na primeira metade do ano. Muita da agressividade de Christian Horner foi despotelada por isso. A maneira como compreendeu precisar de manter a calma antes de sair no carro em Abu Dhabi e cumprimentar o rival não está ao alcance de todos.

Hamilton continuou a operar a um nível superior, a que tem habituado o paddock. A única diferença é que este ano teve alguém ao nível para forçar os pequenos erros necessários. Bater o recorde de maior número de pontos de um 2º classificado pela segunda vez mostra isso.

3 – Lando Norris

Foram muitos os que vaticinaram um rude acordar para Lando Norris em 2021 e, no final do ano, foram muitos os que tiveram que engolir as suas palavras. Quando se esperavam dificuldades acrescidas para Norris com a presença de Daniel Ricciardo na equipa, foi na verdade o australiano quem ficou para trás. Norris tomou a iniciativa de liderar a McLaren em 2021 e Ricciardo nunca mostrou velocidade para o contrariar.

Durante a maior parte do ano o britânico mostrou uma compreensão perfeita do que a McLaren conseguia fazer na sua temporada: pontuar consistentemente e incomodar os Mercedes e Red Bull quando possível. Nas primeiras 10 corridas do ano, Norris só ficou fora do Top 5 uma vez. No segundo GP do ano chegou mais um pódio. Depois outro no Mónaco. E depois mais um na Áustria onde se qualificou duas vezes entre os 3 primeiros.

Após a pausa de Verão a música mudou. A McLaren viu-se em maus lençois no que tocava ao seu ritmo comparada à Ferrari e, dobradinha brilhante de Monza à parte (onde Norris fez o melhor resultado da carreira mas teve que ver Ricciardo vencer), o jogo passou a ser conseguir pontuar com consistência. Após Monza, Norris não falhou o Top 10 uma única vez, cumprindo essa tarefa.

Tendo passado um ano quase inteiro à frente de Valtteri Bottas e Sergio Pérez no campeonato, a única grande falha de Norris foi mesmo a desobediência da ordem de parar na equipa que lhe custou uma vitória em Sochi (depois de ter feito pole position e ter-se defendido de Hamilton durante a prova). Nas 20 outras corridas deixou o vencedor de corridas Ricciardo a pensar na vida.

4 – Carlos Sainz

Se Charles Leclerc achava que a troca de um campeão do mundo como Sebastian Vettel lhe traria a paz e tranquilidade na forma de um complacente colega de equipa, Carlos Sainz demorou poucas corridas a habituar-se ao seu novo Ferrari e a retirar-lhe essa impressão.

De todos os pilotos que mudaram de equipa após 2020, Sainz foi de longe aquele que melhor se adaptou ao novo chassis de 2021. Na sua terceira qualificação da temporada já estava na frente de Leclerc. O primeiro pódio da Scuderia pertenceu a Sainz. Por uma vez na vida o espanhol até conseguiu que as câmaras de televisão o focassem tempo suficiente durante o GP da Turquia para receber a honra de Piloto do Dia pela primeira vez, pela recuperação de último a 8º com muitas ultrapassagens à mistura. O pódio na Rússia, em condições de chuva intensa nas últimas voltas, e o do Mónaco também não lhe ficaram nada atrás.

Sabendo que a Ferrari tem as suas fichas apostadas no colega de equipa num contrato mais longo que o seu, Sainz tem vindo a conquistar o seu espaço em Maranello e praticamente acabando com todas as conversas sobre uma entrada de Mick Schumacher na equipa a curto prazo.

Tendo terminado na frente de Leclerc no campeonato, as performances de Sainz deixam no ar uma das mais interessantes dúvidas da categoria para 2022: se o próximo Ferrari for competitivo, continuará a existir harmonia interna na equipa?

5 – George Russell

Uma certa sensação de fim de ciclo parecia envolver o universo da Mercedes em 2021 e George Russell desde cedo compreendeu que, quer fosse para acompanhar Lewis Hamilton ou substituí-lo, a vaga pela qual estava à luta desde a estreia na F1 em breve ficaria disponível. E o inglês estava determinado em conquistá-la.

Talvez até demasiado nas primeiras provas. Um acidente com o Mercedes de Valtteri Bottas em Imola valeu-lhe pontos preciosos perdidos ao serviço da Williams e um raspanete público de Toto Wolff. Não se deixando abater, Russell esclareceu ter percebido a razão publicamente e lançou mãos à obra, culminando num resultado conjunto excelente com os pontos conquistados na confusão da Hungria, em que disse à equipa para o usar para beneficiar o colega de equipa Nicholas Latifi. As lágrimas de emoção mostraram bem a dimensão do resultado para a equipa.

Na prova seguinte uma qualificação do outro mundo quase lhe valeu uma inacreditável pole position, mas a chuva dar-lhe-ia ainda o pódio no dia seguinte. Chuva também presente quando se qualificou em 3º lugar para o GP da Rússia, num Williams que, embora mais competente que em 2020, dificilmente se poderia considerar rápido sob qualquer perspetiva.

No total foram 4 corridas nos pontos, depois de 3 anos a tentar pontuar com a Williams, e uma merecidíssima promoção para o lugar de Bottas na Mercedes. Lugar onde se espera que dê grandes dores de cabeça na luta interna com Hamilton.

6 – Pierre Gasly

Ainda a cavalgar no boa forma que tem vindo a demonstrar desde o primeiro pódio na F1 de 2019, Pierre Gasly está a deixar cada vez menos margem de manobra à Red Bull para justificar a sua não-inclusão na equipa principal.

Durante todo o ano foi comum ver o francês a fazer pleno uso do melhor Toro Rosso / AlphaTauri de sempre para se qualificar no Q3 logo atrás dos Mercedes e Red Bull, com algumas sessões em que fez Sergio Pérez passar a vergonha de não ser o segundo melhor carro patrocinado pela marca austríaca. Em corrida, vale a pena falar sobre dois incidentes trapalhões no Bahrain e no sprint de Monza que custaram mãos cheias de pontos à equipa, mas tirando isso não há nada a apontar ao piloto.

Ascendendo ao pódio no Azerbaijão (3 anos seguidos a figurar nos 3 primeiros), Gasly teve uma posição média de chegada de 7º ao longo do ano. Para contexto, o colega de equipa Yuki Tsunoda só conseguiu acabar acima dessa posição 2 vezes em 22 tentativas. A diferença para Tsunoda, aliás, acabou rapidamente com os elogios de Helmut Marko ao japonês, já que Gasly foi o piloto com maior diferença percentual de pontos face ao colega de equipa.

O seu único problema é parecer estar a ficar demasiado “grande” para a AlphaTauri, sem um caminho claro de progressão. Mas que se está a tornar um ativo cada vez mais apetecível para o pelotão intermédio, está.

7 – Charles Leclerc

Com um Ferrari de regresso a um nível respeitável, algo que nem parecia previsível meses antes da temporada começar, Charles Leclerc acabou por sofrer de um síndrome que o novo colega de equipa Sainz tem sofrido ao longo dos anos: raramente foi focado pelas câmaras enquanto fazia o seu bom trabalho em (relativo) silêncio.

Fez duas pole positions extremamente impressionantes no Mónaco e em Baku, mas o azar bateu-lhe à porta em ambas as corridas. Em Baku simplesmente foi perdendo terreno para carros mais rápidos e terminou 4º, mas no GP caseiro de Monte-Carlo sofreu o tremendo golpe de não poder sequer partir devido ao acidente de qualificação que sofrera. Quando os candidatos ao título chocaram em Silverstone liderou a esmagadora maioria da prova, antes de ser cruelmente negado a sua 3ª vitória de F1 pela velocidade incrível do Mercedes de Lewis Hamilton.

Sainz provou ser mais rápido com o que estaria a contar, mas após a pausa de Verão foi o mais eficaz dos dois pilotos por margem mínima, precisamente na altura em que a equipa apresentou a versão melhorada do seu motor, e acumulou Top 5 de tal forma que foi fulcral para roubar o 3º lugar do mundial de construtores à McLaren.

Da mesma forma que a qualidade da F1 melhorou drasticamente quando Verstappen finalmente teve acesso a um carro de topo, há a esperança que a Ferrari acerte o passo no regulamento de 2022, para Leclerc ter a oportunidade de mostrar todo o seu talento.

8 – Fernando Alonso

A saída surpresa de Daniel Ricciardo da Renault abriu uma porta para o regresso não muito inesperado de Fernando Alonso à Fórmula 1, mas nem todos os quadrantes do paddock acharam a melhor das ideias. Prestes a fazer 40 anos, o espanhol iria retirar lugar a um dos numerosos jovens talentos dos franceses, juntando mais críticas ao aparente desperdício que a Alpine fazia com a sua academia de pilotos.

Com um carro que não tinha nada a ver com o ritmo do RS.20, Alonso começou o ano com uma entrada no Q3 e, pela sexta corrida dava à equipa o seu melhor resultado até então (6º lugar no GP do Azerbaijão). E isso foi antes da grande contribuição do bicampeão para a equipa, no GP da Hungria. Graças à confusão da partida, Hamilton fora colocado no fundo do pelotão enquanto o Alpine de Esteban Ocon liderava. Para garantir o triunfo, Alonso teria que vender cara a ultrapassagem para atrasar o progresso do campeão em título. E assim foi. Alonso frustrou Hamilton com 11 voltas de condução defensiva, as suficientes para um triunfo Alpine que teve tanto de mérito de Ocon como do homem do outro lado da garagem.

Depois desse episódio houve ainda direito a um momento de matreirice em Sochi em que o espanhol, farto de se queixar de que pilotos abusavam dos cortes na primeira curva da primeira volta com a conivência dos comissários, nem tentou cumprir o traçado na primeira curva do GP da Rússia de modo a ganhar tempo e posições. Foi certamente uma demonstração bem pública da incongruência, dado que não pôde ser penalizado por ter cumprido as regras à justa ao regressar na área designada pela FIA…

A Alpine pode até não conseguir fazer o seu projeto de F1 vingar, mas Alonso já deixou claro que se isso suceder não será por sua causa.

9 – Valtteri Bottas

Se esta lista tivesse sido elaborada durante a pausa de Verão, Valtteri Bottas estaria bem longe de se encontrar nela. O início do ano foi o mais apático de todos os que passara na Mercedes. Ao contrário de 2019 e 2020 nem sequer conquistara vitórias, acumulando alguns 3º lugares atrás de Verstappen e Hamilton. No GP do Reino Unido, por exemplo, nem conseguira sequer chegar perto do Ferrari de Charles Leclerc, enquanto o colega de equipa conseguiu vencer mesmo com uma penalização de 10 segundos.

Na última corrida antes do Verão calculou mal uma manobra em piso molhado e eliminou 3 carros de competição, sendo penalizado, e não teve o seu contrato renovado na Mercedes. No entanto, como o próprio referiu, um contrato de 2 anos com a Alfa Romeo deu-lhe a estabilidade há muito desejada. A partir do momento em que contou com ela, viu-se um regresso do Bottas ao nível dos seus tempos de líder da Williams.

Entre o Verão e o GP dos EUA foi o piloto do grid que mais pontuou, contando-se excelentes performances nas qualificações sprint (venceu 2 para roubar os pontos máximos aos Red Bull), nas qualificações normais (só Verstappen fez mais poles na segunda metade do ano) e um memorável GP da Turquia em que dominou de ponta a ponta sem dar margem aos adversários em condições de piso molhado (quando no ano anterior tivera uma prova terrível no mesmo circuito).

Liberto da pressão psicológica de temer pelo contrato seguinte, Bottas acredita que está no seu melhor estado de espírito e com a sua melhor performance em pista. Os resultados de 2021 parecem concordar.

10 – Sergio Pérez

Foi muito difícil classificar o 10º posto da lista. Qualquer que fosse a escolha envolveria deixar de fora 2 vencedores de corridas. No final, tornou-se difícil não a entregar a Sergio Pérez.

Porquê tão baixo depois de ter ficado em 2º em 2020? Já se percebeu que há poucas posições mais complicadas na F1 que a de segundo Red Bull, mas as corridas foram passando e Pérez continuava a não conseguir fazer boa figura em fins-de-semana consecutivos. A vitória em Baku foi conseguida com tenacidade (segurando Hamilton) mas também com sorte (o furo de Verstappen) e daí até à pausa de Verão só mais um pódio e 3 corridas sem pontuar (que custaram caro à Red Bull nos construtores).

Os 3 pódios seguidos de Turquia, EUA e México foram uma demonstração do que o piloto mexicano tinha para dar à Red Bull que o seu antecessor não tinha, e a maneira como forçou Hamilton a perder 8 segundos para Verstappen no GP de Abu Dhabi valeram-lhe louvores de todos os membros da equipa.

Mas para 2022 terá que corrigir o que esteve mal este ano ou não terá a mínima hipótese de sobreviver no universo da Red Bull.





Top 5 – Fórmula 2 em 2021

18 12 2021

Foram várias as intervenções de Stefano Domenicalli e de membros da FIA sobre o facto de 2021 terem demonstrado que “a escada da F1 funcionar”, em referências às capacidades das categorios júnior da F1 conseguirem atrair pilotos talentosos para as suas corridas. Nesse quesito é inegável que têm passado muitos talentos no grid. Já no objetivo de levar os melhores para a F1…

Apenas um piloto conseguiu ser promovido em 2021. O 3º classificado do campeonato. Que tinha mais temporadas de F2 disputadas que os dois pilotos à sua frente. Guanyu Zhou foi sem dúvida competente ao longo do ano, mas seria difícil de encontrar alguém capaz de argumentar que a nível automobilístico tenha apresentado algo que Oscar Piastri e Robert Shwartzman não tenham apresentado em maior quantidade.

Estes dois últimos deram à Prema um dos títulos mais fáceis da sua história recente, sendo que o seu abandono para lugares de pilotos de testes na F1 abrirá um vácuo significativo na equipa. UNI-Virtuosi e Carlin acabaram por ver os seus pilotos demonstrarem um nível aquém do esperado. O resultado parece ser uma substituição completa das suas duplas (particularmente azarado para Felipe Drugovich, que no final do ano começou a demonstrar algum do seu ritmo de 2020).

Continuando a moda de dinamarqueses que não conseguirem cumprir as expectativas, começada por Vesti na F3, Christian Lundgaard acabou por não fazer melhor que um pódio ocasional e procurou refúgio na IndyCar. Marcus Armstrong também viu a sua movimentação para a DAMS não render mais do que uma vitória sprint (se bem que o seu azar tenha sido muito).

Liam Lawson não conseguiu mostrar o mesmo rendimento produzido no seu vice-campeonato de DTM, mas parece continuar a contar com o apoio da Red Bull (como se vê pelo teste pós-temporada pela AlphaTauri). Quem terminou a sua aventura na Fórmula 2 foi a HWA, que nunca conseguiu mostrar bons níveis de competitividade na categoria.

1 – Oscar Piastri

É difícil de apontar pilotos de anos recentes com um nível de carreira pré-F1 tão impressionante quanto o de Oscar Piastri sem referir nomes como Charles Leclerc e George Russell. Vice-campeão de F4 Britânica à primeira tentativa; campeão de Fórmula Renault Eurocup, F3 e F2 à primeira tentativa. Os números falam por si.

Em 2021 também o fazem, com 5 poles consecutivas e 6 vitórias (4 feature). Houve espaço para alguns erros nas primeiras provas do ano, como o abandono na primeira feature do ano no Bahrain, mas a grande força do australiano em 2021 pareceu residir justamente numa capacidade fora do comum na F2 para se manter fora das confusões e conduzir a grande velocidade quando tinha terreno livre para isso.

Ninguém conseguiu emergir de cada fim-de-semana de competição como destaque de maneira tão consistente quanto Piastri, o que torna ainda mais gravoso que tenha que passar 2022 a testar o Alpine sem competir com ele. Resta ver se conseguirá que a marca francesa lhe assegure um assento para 2023 na F1 e noutra categoria para 2022…

2 – Théo Pourchaire

O facto de a Alfa Romeo ter procurado resistir durante tanto tempo às exigências de contrato de múltiplos anos de Guanyu Zhou, de modo a manter as suas opções em aberto para anos futuros, diz muito sobre o quão cotado Théo Pourchaire é enquanto membro do seu programa de jovens talentos.

Campeão de Fórmula 4 ADAC em 2019, Pouchaire já se tinha tornado vice-campeão de Fórmula 3 à primeira tentativa em 2020 e, por isso, ter somado duas vitórias na estreia de Fórmula 2 (uma delas de ponta-a-ponta após pole position no Mónaco) foi tão impressionante quanto pouco surpreendente. O ritmo diabólico que foi capaz de usar, especialmente comparado com o experiente colega de equipa Christian Lundgaard, foi sempre incrível de ver.

Os naturais erros ocasionais, bem como o facto de a ART não ser uma equipa tão bem oleada quanto já foi anteriormente, não lhe permitiram ainda lutar pelo título de 2021 mas parte para 2022 como o favoritíssimo ao título de 2022. Se o conquistar almejará a estreia na F1 que Piastri não conseguiu para já.

3 – Robert Shwartzman

Promovido à condição de líder da Prema com a saída de Mick Schumacher e tendo sido o melhor russo da F2 em 2020 (na frente de Nikita Mazepin), Robert Shwartzman era o grande favorito para esta temporada e pode parecer injusto não lhe dar o mesmo 2º lugar que obteve no campeonato, mas quando a fasquia estava tão elevada fica complicado não ficar decepcionado com o 2021 do piloto.

O problema principal residiu num início cheio de tropeções. Nos dois primeiros fins-de-semana do ano ficou a zeros em metade das corridas e perdeu o comboio dos candidatos ao título. Baku e Silverstone entregaram-lhe as primeiras vitórias do ano mas apenas em sprints, nos quais as más qualificações até ajudavam. Mas de Monza em diante a história foi outra: terminou todas as corridas entre os 5 primeiros (12 provas). A ausência de mais vitórias custou-lhe mais em termos de perceção pública do que no campeonato.

Parte para 2022 conseguiu um papel de piloto de testes na Haas, cada vez mais influenciada por dinheiro russo. Que teria muito mais para demonstrar do que Mazepin é óbvio, e a sua presença no programa de jovens Ferrari é uma ajuda. Mas caso a família Mazepin decida ter uma participação mais ativa na equipa poderá ser beneficiado com um lugar que certamente merecia, dada a sua prestação nas categorias de base.

4 – Guanyu Zhou

Passemos rapidamente pelas más notícias: Guanyu Zhou parte para a Fórmula 1 em 2022 com apenas um pequeno título na F3 Asiática de 2021 (o “aquecimento” para a F3 e F2 deste ano, de certa forma), e sendo batido no campeonato pelo colega do programa de jovens da Alpine.

Posto isto, Zhou fez pleno uso das lições aprendidas em anos anteriores de F2 ao lado de Luca Ghioto e Callum Ilott em 2021, sendo dos mais regulares na maioria das corridas. Integrado na UNI-Virtuosi, estrutura considerada menos capaz que rivais como a ART e Prema, o chinês conseguiu colocar o bem-cotada novo colega de equipa (Felipe Drugovich) a um canto durante a quase totalidade das corridas, com direito a vitórias imperiais como as das feature do Bahrain e de Silverstone.

Adaptável, perspicaz e com bons apoios, Zhou terá que se fazer valer de todas estas caraterísticas para durar mais do que 1 ano na F1, com a tarefa dificultada pela presença de Valtteri Bottas no outro monolugar da Alfa Romeo. Tendo como base a sua temporada de F2, Zhou tem no seu arsenal as armas para durar.

5 – Ralph Boschung

Ralph Boschung é um caso atípico de uma carreira nas categorias de base. O suíço conta com participações semi-regulares na Fórmula 2 desde 2017, sem nunca ter feito pódios até este ano. A participação na última ronda de 2020 valeu-lhe um lugar confirmado na Campos para 2021, num ano em que a histórica equipa espanhola correu de cinzento em vez do tradicional laranjar em memória a Adrián Campos.

O fundador faleceu de forma inesperada durante o período entre as duas temporadas e deixou a estrutura com uma nítida falta de rumo. A dança das cadeiras permanente no lugar ao lado de Boschung deixou-o com a responsabilidade de manter a cabeça à tona, e foi exatamente isso que o piloto fez.

59,5 dos 66,5 pontos da Campos foram obtidos por Boschung e neste conjunto incluíram-se um fim-de-semana monegasco em que terminou entre os 6 primeiros em todas as provas e dois pódios (um deles feature) no final do ano. Em 2022 competirá na sua sexta temporada de F2, com a Campos. Mesmo estagnado na escada para a F1, Boschung fez um papel que a Campos bem lhe terá agradecido este ano.





Jarno Trulli em 2004 – Flash

27 11 2021

A tarefa de classificar a passagem de Jarno Trulli pelo campeonato do mundo de Fórmula 1 é complexa.

Em qualificação e nos seus melhores dias era quase imbatível (até na sua passagem com equipa própria na Fórmula E conseguiu uma pole position). Em corrida, no entanto, há uma razão para que ainda hoje a situação de um piloto a empatar vários atrás de si continue a ser chamada de “comboio Trulli” (Trulli Train).

Muitas vezes a arrastar carros do meio da tabela até posições superiores, a verdade é que Trulli teve a oportunidade de mostrar o seu talento em equipas que contemporâneos seus adorariam ter tido, nomeadamente a Renault e a Toyota (nas suas fases de construção). A transição entre as duas equipas, com a temporada de 2004 ainda a decorrer foi um dos momentos definitivos da sua carreira, desde o relacionamento pouco harmonioso com Flavio Briatore até à única vitória na F1 no desafiante circuito de Monte-Carlo.

Antes e depois de 2004, no entanto, houve espaço para demonstrações de todo o seu incrível talento ao volante: o pódio no terrível Prost de 1999, os vários “momentos quase” aos comandos do Toyota e a mudança de equipa a meio da época de estreia na F1 em 1996.

Aproveitando as oportunidades

Com um nome finlandês, em homenagem a Jarno Saarinen (campeão de 250cc em motas em 1972), Jarno Trulli fez um percurso similar ao de muitos outros jovens talentos no caminho até à Fórmula 1, nomeadamente com um título mundial de karting em 1991 e passagens pelas diversas Fórmula 3 nacionais.

Acabou por ser um título na F3 Alemã com 6 vitórias e 10 pódios, em conjunção com um 3º lugar no Grande Prémio de Macau, que lhe abriu as portas da F1. Mas apenas um pouco. Apenas na eterna retardatária, a Minardi. A equipa italiana, apesar de ter permitido a estreia de outro rápido italiano no ano anterior (Giancarlo Fisichella), tivera uma temporada sem pontos em 1996 (primeira vez desde 1990) e as perspetivas para 1997 com Trulli não eram brilhantes (particularmente com o motor Hart…).

Só que a sorte de uns é o azar de outros. Quando Olivier Panis partiu ambas as pernas num forte acidente durante o Grande Prémio do Canadá, a Prost viu-se no mercado à procura de um substituto. As boas performances de Trulli em 7 provas de Minardi (geralmente melhor que o experiente Ukyo Katayama) valeram-lhe uma promoção inesperada para um monolugar que colocara Panis no 3º lugar do campeonato até ao acidente. Boas performance também com a equipa francesa (onse se inclui os primeiros pontos na categoria com um 4º lugar no GP da Alemanha) impressionaram Alain Prost o suficiente para lhe fazer uma oferta de piloto oficial ao lado de Panis para 1998.

Infelizmente para Trulli os dois fatores preponderantes da boa época de 1997 (carro projetado pela antecessora Ligier e motor Mugen-Honda) desapareceram para 1998, quando a equipa procurou afirmar-se como equipa de fábrica da Peugeot. Os fracassados AP01 e AP02 de 1998 e 1999 deram a Trulli temporadas muito difíceis, em que ainda assim bateu Panis, que o relegaram para segundo plano de várias equipas de topo.

O primeiro pódio da sua carreira, numa atípica corrida de 1999 no Nürburgring de condições meteorológicas impresíveis, chamou a atenção da esforçada equipa Jordan, no entanto. Tendo somado 2 vitórias e um 3º lugar nos construtores, a equipa irlandesa parecia perfeita para Trulli, ao lado do líder Frentzen. 2000 provou ser um rude acordar para estas aspirações, com carros pouco fiáveis e alguns acidentes à mistura. 2001 foi ainda pior, desta vez com o italiano na condição de líder de equipa e com 3 pilotos diferentes a rodarem no segundo carro da equipa.

Com um projeto nascente de regresso da Renault como construtora a ser desenvolvido em Enstone, Trulli acabaria por ser contratado por Flavio Briatore para substituir o saído Fisichella (que fez o caminho inverso para a Jordan). 2002 seria a transição, num carro ainda projetado pela antiga Benetton (e como tal, não muito rápido), mas com a vantagem de que o novo colega de equipa, Jenson Button, não duraria para além do ano, fruto de não ser apreciado por Briatore.

Um carro com forte investimento da Renault trouxe um 2003 bem diferente, em que os franceses provaram ser uma estrutura sólida e capaz de aproveitar as oportunidades deixadas escapar pelas 3 principais equipas (Ferrari, McLaren e Williams). Trulli conquistou o segundo pódio da carreira, no GP da Alemanha, e pontuou em 10 das 16 corridas. Só que do outro lado da garagem chegou um novato chamado Fernando Alonso, que somou 4 pódios e a primeira vitória da carreira.

2004

Era este o principal desafio da carreira de Trulli em 2004: provar a Briatore de que era ele o homem indicado para liderar o assalto da Renault na F1, ao invés do “menino d’ouro” Alonso.

Tendo construído uma reputação sólida como um dos melhores qualificadores da Fórmula 1, Trulli conseguia geralmente equiparar-se bem a Alonso nos sábados. Era em melhorar a performance de domingo que estava a maneira de virar o jogo a seu favor. Nas primeiras 5 provas do ano o saldo era 21 pontos para ambos e os pódios também igualados em 1 para cada. Foi neste contexto que chegou o GP do Mónaco.

Com a qualificação a ser o mais importante aspeto em Monte-Carlo, Trulli aproveitou um Renault muito bem adaptado ao circuito para fazer uma das mais estonteantes voltas da sua vida, garantindo pole position por mais de 3 décimas sobre o 2º e 4 décimas sobre Alonso em 4º. Com os nervos naturais da situação a aliarem-se a duas partidas abortadas, Trulli viu-se forçado a defender posição contra Alonso durante o início da corrida, seguidos de Button (agora na BAR).

A primeira ronda de paragens nas boxes não mudou quase nada, mas logo a seguir seguiu-se o caos. Primeiro foi Alonso que teve um incidente com Ralf Schumacher no túnel, que acabou com o seu abandono; depois, no Safety Car que se seguiu, um desentendimento entre Michael Schumacher e Juan-Pablo Montoya eliminou mais um obstáculo à vitória de Trulli. No final sobrou apenas Button para segurar, o que Trulli fez com sucesso para vencer o GP do Mónaco.

Tudo parecia feito para permitir ao piloto italiano mostrar-se como um rival à altura de Alonso, até porque ganhou mais pontos ao colega de equipa nas 3 corridas seguintes, mas Trulli tinha a sensação de que Briatore não o levava com suficiente seriedade. No de França, em casa, Alonso bateu-se com o Ferrari de Schumacher pela vitória enquanto Trulli segurava o outro de Barrichello para 3º. Quando o pódio foi perdido na última curva da última volta, Briatore ficou furioso.

Para Trulli estas explosões e a oferta de condições menos “sérias” nas negociações do novo contrato indicavam que poderia ser altura de terminar o relacionamento. Uma posterior zanga no GP da Bélgica, quando Trulli fez mais uma pole mas terminou a corrida apenas em 9º, ditou que o piloto nem pôde acabar o ano com a Renault, sendo substituído por Jacques Villeneuve.

Aproveitando ainda faltarem 3 corridas para o final do campeonato, Trulli aproveitou para as disputar com a equipa com a qual assinara contrato para 2005: a Toyota.

O tigre de papel: Toyota

As corridas finais de 2004 não foram espetaculares mas a contratação de Trulli fazia parte de um vasto programa de renovação da estrutura fundada em 2002, que incluía a colocação de Ralf Schumacher no outro carro para 2005 e a prévia contratação do projetista Mike Gascoyne em 2003. Aproveitando mudanças de regulamento (diminuição do tamanho das asas e difusores), a equipa apostou forte nessa temporada.

Não foi preciso esperar muito. Na segunda prova de 2005 chegou o primeiro pódio da Toyota, cortesia de Trulli na Malásia. Na prova seguinte chegou o 2º. No total foram 3 pódios nas primeiras 5 corridas, que deram à equipa japonesa o estatuto de melhor das restantes atrás de Renault e McLaren. O 3º lugar nos construtores apenas foi perdido para a Ferrari devido à farsa do GP dos EUA (com apenas 6 carros), mas Trulli provou ser algo inconsistente na segunda metade da temporada e foi batido em pontos por Schumacher.

A partir daqui começaram as alterações duvidosas na harmonia interna da estrutura. A mudança de fornecedor de pneus por motivos nacionalistas (de Michelin para Bridgestone) tornou o modelo de 2006 um monstro para guiar, colocando a equipa de volta ao pelotão do meio. 2007 trouxe ainda piores performances, mas com Trulli a liderar a equipa de forma clara, a ponto de o colega de equipa Schumacher ser corrido a favor de Timo Glock a partir de 2008.

A enorme mudança de regulamentos de 2009 dava outra oportunidade à Toyota. A equipa foi das poucas a apostar num conceito inovador de difusor traseiro, dando-lhe a melhor temporada pós-2005. Em condições de chuva na Malásia, Trulli insistiu em mudar os pneus mas a equipa opôs-se por ser demasiado arriscado (uma decisão errada). Na corrida seguinte a Toyota colocou-se em 1º e 2º na primeira curva do Bahrain, mas estratégias erradas ditaram apenas a conquista de um pódio. Houve também um 2º lugar de Trulli no Japão, mas o piloto tinha a sensação de que 7 anos sem uma vitória poderiam pesar na decisão da Toyota sobre continuar ou não na F1 em clima de crise financeira.

E assim foi.

A Toyota abandonou nos últimos momentos de 2009, deixando aquilo que seria chamado por quem o testou como um ótimo carro de 2010 sem possibilidade de correr em pista.

Por seu turno, Trulli apostou ingressar numa das novas estruturas da F1 em 2010: a Lotus malaia de Tony Fernandes. Só que o italiano rapidamente compreendeu que as promessas de investimentos avultados na equipa nunca se concretizaram. Correndo no fundo do grid durante dois anos, Trulli decidiu que já vira o suficiente, e saiu da categoria.

Tendo fundado ainda uma equipa de Fórmula E, Trulli chegou a conseguir uma pole position no e-Prix de Berlim de 2015 mas a equipa só durou até meio da segunda temporada.

Legado

É difícil de argumentar que Jarno Trulli não é um dos pilotos mais rápidos da história da categoria no que toca a ritmo de uma volta. As voltas canhão do brilhante italiano eram fenomenais de ver. O grande problema de Trulli, em qualquer fase da sua carreira, sempre foi conseguir mostrar esse andamento nas várias fases de fins-de-semana de corrida, uma consistência essencial para quem almeja ser algo no mundo de F1.

Ainda assim, 11 pódios ao serviço de 3 equipas na F1 é um marco que mostra também versatilidade no ritmo do italiano. Outra impressionante estatística são as 8 temporadas entre os 10 primeiros (em 15 participações) do campeonato, tornada ainda mais impressionante quando se considera que na maioria dos anos Trulli nunca teve carro para andar nos primeiros lugares da grelha.

Nos dias de hoje, Trulli passa a maior parte do seu tempo ocupada com a sua quinta onde produz vinho em Abruzzo e a acompanhar o filho mais velho, Enzo Trulli, na sua própria carreira de automobilismo (foi este ano campeão de F4 dos EAU).

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“Flash” anterior: Lotus em 1968
“Flash” seguinte: Lancia em 1956

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Fontes:
Beyond the Grid \ Jarno Trulli
Bleacher Report \ Jarno Trulli
Wikipedia \ Jarno Trulli





Lançamentos 2021 – Red Bull RB16B

23 02 2021

A pista de que a Red Bull não traria grandes alterações ao seu monolugar para 2021 provavelmente estaria logo à partida na utilização do “B” no nome do chassis ao invés de continuar a sua numeração como em todos os outros anos na categoria. Ironicamente as alterações visuais que se notaram mais acabaram por ser as que diziam respeito à saída da Aston Martin (os logos foram substituídos pelos da Honda, na maioria dos casos) e a entrada dos patrocinadores pessoais de Sergio Pérez.

O RB16B é a grande esperança da equipa para que possa continuar este ano onde terminou no ano passado, a vencer com algum conforto os Mercedes de Hamilton e Bottas. O grande esforço da Honda em antecipar os desenvolvimentos de motor de 2022 para 2021 (já mencionados na apresentação da AlphaTauri) é a grande arma dos austríacos para terminar o domínio da Mercedes no mundial.

E é também o melhor trunfo da estrutura para conseguir manter os serviços de Max Verstappen, depois de Christian Horner ter confirmado na semana passada que existem cláusulas que poderiam permitir a saída do holandês na eventualidade de mais um ano passado a morder os calcanhares da Mercedes. Até porque o holandês tem mostrado serviço mais do que suficiente para poder apontar o carro como a causa da ausência de títulos desde 2013 na equipa.

As possibilidades de conquistar o campeonato poderão depender da chegada de Sergio Pérez para o segundo carro. O mexicano não só compensou a saída da Aston Martin com os seus patrocínios, como é também a grande aposta da equipa para conseguir dar um bom wingman à sua estrela principal. A adptação de Pérez a um carro que foi descrito pelos engenheiros da Red Bull como temperamental será crucial.

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Fonte:
Race Fans \ Red Bull must pick up where they left off to take the fight to Mercedes with new RB16B





Afastado até 2012

28 12 2011

Bom, antes de mais este post vai ser bastante curto. É apenas para dizer que tenho andado bastante longe do blog, à conta das minhas prendas de Natal me terem mantido ocupado. Mas é perfeitamente razoável porque, para qualquer fã de automobilismo, ter à disposição F1 2011 e Gran Turismo 5 ocupa bastante o tempo… Enfim, aproveito este tempo de não fazer nada o melhor possível, antes que chegue Janeiro quando vou voltar a deixar de ter o tempo para isso, portanto não devo publicar mais nada até ao ano novo.

Antes de me despedir, aproveito para desafiar quem por aí tenha um destes jogos, é só pesquisar o ID de “Voaridase”. E, informo o Marcos Antônio que já quebrei o jejum de vitórias da Williams… xD

Bom ano 2012 a todos.





Post 100 – 1 ano

14 12 2011

Este post era para ter sido elaborado ontem, mas confesso que simplesmente não tive tempo de o fazer. Portanto, façamos de conta que isto está a ser publicado no dia 13…

É verdade já passou um ano (e por coincidência 100 posts) desde que comecei a publicar aqui neste pequeno recanto, e após este tempo acho que posso-me dar por satisfeito com o que obtive. Além de ter uma média de 20 pessoas por dia a darem-se ao trabalho de ler as minhas opiniões sobre o automobilismo, tenho também a sorte de que entre estes estejam alguns dos melhores escritores de blogs que andam por aí.

Não me peçam para referir os nomes de todos, sob pena de deixar alguém de fora, mas decididamente tenho que agradecer aos que me colocaram nas suas listas, e um agradecimento especial ao Paulo do Continental Circus, que chego a publicar posts no blog dele sobre este pequeno espaço. Muito obrigado.

E, espero estar aqui para o ano, ainda a mandar as minhas ideias sobre este desporto que todos adoramos…





Luta em Dusseldorf

3 05 2011

Permitam-me que escape um pouco ao tema automobilístico por uns breves momentos. Dentro de uma semana, iniciar-se-á em Dusseldorf (Alemanha) o Festival Eurovisão da Canção, onde os países do continente europeu se defrontaram para decidir qual o país com a melhor música do ano.

Os Homens da Luta vão à Eurovisão.

Portugal participará na primeira semi-final no dia 10 de Maio, e, caso passe, a “nossa” final será no dia 14. A nossa música foi escolhido num Festival da Canção interno, no qual, este ano, os Homens da Luta foram os vencedores, com a canção “A Luta é Alegria”. Sem qualquer afiliação a partido algum, os Homens da Luta dão voz a uma sociedade cada vez mais mergulhada na crise económica. Não admira que na metade da cotação do público (a outra metade é do júri) tenham ficado no topo…

Enfim, será com esta música que iremos concorrer, e confesso que a princípio pensei que talvez não fosse algo muito bom, mas já começo a apoia-los mais, já que parecem verdadeiramente desprovidos de ideologia política, e o seu bom humor é visível. Além do mais, há muito que a Eurovisão deixou de ser sobre quem faz canções boas, nos últimos tempos tem sido os Balcãs a votarem uns nos outros (alguém se lembra da Ucrânia em 2007…), e o mesmo a passar-se na Escandinávia, logo países ocidentais não têm hipótese nenhuma!

Assim, se vamos, ao menos que dêmos um pouco do humor ao público, que bem precisa de ser animado. E ninguém melhor que os Homens da Luta, que em vez de se sentarem a falar em tom monocórdico na conferência de imprensa, fizeram algo bem mais divertido, fazendo os seus cânticos de “Luta, luta, camarada luta contra a reacção!”. Se não quiserem ver tudo, ao menos vejam os dois minutos finais… Imperdível.





Valorizando o presente

2 01 2011

As passagens de ano são sempre muito celebradas. Um novo ano é sempre encarado como uma promessa de tempos melhores, com muita saúde, dinheiro, amigos e felicidade. Embora estejamos sempre na esperança de que, com cada ano que se inicie, sejamos surpreendidos positivamente, o mais comum é que exaltemos o passado como os melhores momentos da vida.

Tomemos o exemplo da Fórmula 1, em que os anos 70/80 foram eleitos como a melhor década de sempre, segundo uma sondagem da Autosport portuguesa. Sempre acreditei que este fascínio por essa época do desporto automóvel fosse um pouco exagerada (nalguns casos por pessoas que nem viveram nessa altura…), visto que ao longo do tempo costumam ser construídos mitos, acontecimentos que ao longo dos tempos são engrandecidos excessivamente. Falo, por exemplo, das ultrapassagens, que, embora abundantes, duvido seriamente que ocorressem a cada curva das corridas, como muitos vídeos nos levam a crer.

Com isto não pretendo diminuir os feitos da época, isso seria igualmente errado… Gostaria apenas de afirmar que devemos olhar para o passado com a intenção de buscar elementos que ajudem a melhorar o presente, e não com o propósito de o recriar.

Muitas vezes apenas damos pela falta das coisas quando estas desaparecem, e creio que isso poderá ser o caso do actual leque de pilotos, descrito por Jackie Stewart como o melhor de sempre… Personagens como Vettel ou Hamilton não são verdadeiramente considerados os melhores dos 60 anos de Fórmula 1, contudo, daqui a uma ou duas décadas, a sua falta será sentida.

Dito isto, creio que não devemos procurar recriar o que se passou no passado, mas antes criar uma identidade própria, pois 2010 foi um dos melhores anos de sempre e deverá ser trabalhado para construir um futuro risonho a todos.

Feliz Ano Novo!