Nascido em Miami em 1927, Phil Hill foi dos campeões mais atípicos da história da Fórmula 1. Não necessariamente a nível de carreira para um piloto que competiu na F1 dos anos 60, uma vez que os seus princípios foram os de mecânico e piloto simultaneamente (e um desejo bem forte de competir com tudo o que tivesse rodas), mas sim pela mentalidade com que abordava a competição.
Sobre a maneira como lidava com o automobilismo, Hill era citado da seguinte forma:
“O automobilismo atrai o que de pior tenho em mim. Sem ele, eu não sei que tipo de pessoa me poderia ter tornado. Mas não sei se gosto da pessoa que sou agora. Correr torna-me egoísta, irritável, defensivo. Se pudesse sair deste desporto com qualquer ego, fá-lo-ia.”
Dificilmente as palavras de um intrépido aventureiro dos anos 60, mas a verdade é que Hill não se deixava intimidar. Descrito como um perfeccionista disciplinado, o americano esforçava-se por esmiuçar todos os detalhes dos carros que conduzia e acabou a sua carreira com um título de F1, 3 vitórias nas 24 Horas de Le Mans, 3 vitórias nas 12 Horas de Sebring e 1 nas 24 Horas de Daytona.
Perigos e prazeres do automobilismo
Pouco próximo dos seus pais durante a juventude e sem grande propensão para desportos, o caminho de Hill até ao automobilismo acabou por vir de um fascínio mecânico por carros. Tendo chegado a começar a tirar uma licenciatura em business administration na Universidade do Sul da Califórnia, o americano acabaria por desistir para se tornar ajudante mecânico de um piloto com garagem própria.
Conduzir ensinou confiança ao jovem Hill, que também aprendeu piano durante a sua infância, e a maneira como resolvia o seu medo de falhar era pela atenção ao detalhe. Não demorou muito para que passasse à competição, vencendo pela primeira vez em 1949 num carro desportivo.
O seu grande defeito era a tensão em que se colocava a si próprio antes das provas, preocupando os seus chefes de equipa e causando estragos físicos a si próprio (chegou a estar de forma tenso que desenvolveu úlceras e ficou 10 meses fora de competição, sob a influência de fortes analgésicos).
Mas, demonstrando que o piloto balanceava os perigos e prazeres do automobilismo como poucos, Hill começou a impressionar com Ferraris de equipas privadas, acabando por ser convidado para a marca oficial em Le Mans, onde triunfou ao lado de Olivier Gendebien em 1958 sob chuva intensa. Também triunfou em Sebring com Carroll Shelby nas 12 Horas num Ferrari, assim como em Daytona com Pedro Rodríguez nas 24 Horas (também de Ferrari).
Tudo conquistas sonantes com nomes sonantes. Mas Enzo Ferrari hesitava em colocá-lo na equipa de F1, achando-o demasiado sensível para ser bem-sucedido. Mas os falecimentos de Peter Collins e Luigi Musso forçaram-lhe a mão.
1961
Viver na Europa foi uma experiência diferente para Hill, que vivia num hotel ao lado da fábrica da Ferrari e fazia vida relativamente solitária. O americano mantinha-se em forma e explorava monumentos e castelos nas horas livres, além de manter o seu amor por música com idas à ópera. Nas pré-temporadas regressava à Califórnia para restaurar carros antigos (e pianos), mas a inatividade irritava-o.
Com alguns pódios na época de estreia na F1 (1958 em Itália e Marrocos), Hill precisou de esperar até 1960 para fazer uma temporada completa (com exceção das 500 Milhas), ano em que venceu um Grande Prémio pela primeira vez com um triunfo em Monza, bem na frente dos tiffozi. O regresso no ano seguinte acabaria por ser de tristeza.
O ano começou bem, com um 3º lugar no Mónaco e um 2º na Holanda. A vitória chegou em Spa-Francorchamps e já começava a ser claro que a luta pelo título estava confinada ao americano e ao colega de equipa Ferrari, Wolfgang von Trips. Um deslize em França não teve consequências de maior, mas von Trips foi-lhe conquistando pontos no Reino Unido e na Alemanha.
Em Monza, ia a penúltima corrida do ano na sua segunda volta quando von Trips se acidentou com o Lotus de Jim Clark e voou disparado para o público. O jovem alemão morreu, juntamente com 14 espectadores. Hill venceu a prova e o título, mas a experiência foi traumatizante (até porque viria a ser um dos carregadores do caixão de von Trips).
“Nunca experienciei nada tão profundamente triste na minha vida.”
A aventura ATS e mais vitórias em Le Mans
Com um título mal celebrado, Hill iniciou a temporada de 1962 com resultados tão bons quanto nos do ano anterior, mas foi Sol de pouca dura. O americano pontuou nas primeiras três provas do ano, mas acabou por não conseguir mais um único daí em diante. O autodiagnóstico era simples: a fome de vencer e a vontade de se arriscar por resultados desaparecera.
Isso não o impediu de acompanhar Giancarlo Baghetti quando ambos acompanharam vários engenheiros sénior para a criação da ATS (Automobili Turismo e Sport), devido a desentendimentos entre a cúpula e a mulher de Enzo Ferrari (Laura). Apesar da ambição, o projeto seria um falhanço total e em 1963 a melhor colocação foi 11º em Monza. Ainda houve tempo para Hill correr em 1964 com a Cooper e para mais um par de corridas com carros privados, mas o tempo do piloto na F1 tinha terminado (ainda que tenha gravado cenas para o filme “Grand Prix”).
Em Le Mans as participações continuaram, ao serviço de Ford e Chaparral (além de mais 2 vitórias nas 24 Horas durante a estadia na Ferrari); tal como as de carros desportivos (que lhe deram vitórias em Sebring e Daytona).
Hill tem a curiosa distinção de ter vencido a sua primeira corrida de carreira (1949) e a última (1967). Após a reforma dedicou-se ao seu hobby de restauração de veículos e foi também comentador.
Legado
Pouca ocasião terá havido em que um piloto tenha atingido um pico tão alto no automobilismo enquanto, simultaneamente, demonstrava opiniões tão negativas sobre o que correr lhe fazia à saúde mental.
Hill começou a correr como forma de desenvolver a sua confiança, permaneceu em competição apesar de ter atravessado felicidades e infelicidades em quantidades similares (e apesar dos nervos que isso lhe dava) e acabaria por dizer que o automobilismo era “um confronto com a realidade”. Para ele “muitas pessoas passam as vidas sem nunca ir a lado nenhum” e o automobilismo ajudava-o a sentir um propósito.
Tendo falecido em 1981 com Parkinson, Hill deixou para trás uma carreira de sonho, tendo passado os seus anos pós-competição como restaurador e casado com a namorada de longa data (Alma Hill), além de ter desempenhado as funções de comentador e de ter recebido a honra de ser introduzido no Hall of Fame do automobilismo norte-americano (sendo o único piloto nascido nos EUA a ser campeão de F1).
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“Flash” anterior: Audi em 2000
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Fontes:
– Britannica \ Phil Hill
– Esportelândia \ Phil Hill
– F1 \ Phill Hill Hall of Fame
– Motorsport \ Phil Hill
– Race Fans \ Phil Hill
– Terceiro Tempo \ Phil Hill
– Wikipedia \ Phil Hill