Porsche com [quase] vitória dupla – ePrix Misano 2024

14 04 2024

Depois de um acidente em cadeia na prova do ano anterior e de críticas de anos recentes, a Fórmula E viu-se mesmo colocada na posição de ter que deixar cair uma das suas provas mais populares em Roma. Enquanto os organizadores tentam descobrir uma alternativa em território romano, a categoria optou por não perder a ligação a Itália e organizou em conjunto com o circuito de Misano um ePrix alternativo.

Palco habitual do GP de San Marino do MotoGP, Misano dificilmente recolheu grande entusiasmo ao ser anunciado. Território extremamente plano, traçado sinuoso e descrito como não particularmente inspirador de conduzir, o circuito ainda tinha a desvantagem de ser uma adição de circuito permanente a uma categoria que pretendia definir-se como casa de circuitos citadinos.

Fundado em 1972, foram as motas que desde cedo deram proeminência a Misano e que o forçaram a realizar alterações quando foi alongado para cumprir a distância mínima obrigatória do mundial de motas (1993). Pequenas modificações adicionais foram sendo realizadas durante os anos seguintes, desde melhorias dos complexos de boxes até apertar a segunda curva.

Ronda 6 – ePrix de Misano (1) 2024

Com um vencedor diferente em cada uma das provas iniciais, havia a expectativa de saber, a continuar a tendência, quem seria o “estreante” seguinte para a lista.

Mitch Evans (Jaguar) bateu Jean-Éric Vergne (DS Penske) na final de qualificação, com a surpresa principal a ser a intrusão do ABT de Nico Müller nas meias-finais. António Félix da Costa (Porsche) em 13º e Jake Dennis (Andretti) em 18º foram os pilotos do pelotão da frente mais deslocados, e que teriam enormes provas pela frente.

Desde o primeiro momento que Misano provou ser uma prova de caos completo, até mesmo pelos padrões da Fórmula E. Uma pista mais larga que o usual e a tentação dos vários pilotos em segurar posição para não liderar significaram que a mobilidade de posições era de uma enormidade gritante. Oliver Rowland (Nissan) provou isto ao navegar quase livremente entre 12º e 1º ao longo da corrida.

O contacto entre pilotos, até por padrões FE, foi elevado, com Vergne a terminar a sua prova em 7º com uma asa dianteira torta e um dos apêndices traseiros em falta. E houve outros pilotos que terminaram a sua prova mais cedo com o mesmo problema (como Nick Cassidy da Jaguar).

No geral, os líderes sucederam-se mas os grandes destaques foram Félix da Costa, Rowland e Dennis. Os três, juntamente com Vergne, começaram a escapar-se ao pelotão de trás até que Vergne serviu de tampão a Dennis nas voltas finais e Félix da Costa começou a gastar a energia extra armazenada que tinha para segurar o ataque final de Rowland. Um emocionado português festejou efusivamente, naquilo que foi um relançar do seu campeonato. Ou seria, não tivesse sido desclassificado várias horas após o fim da corrida e quando a própria categoria já tinha igualmente efusivamente partilhado fotos do piloto a festejar…

A causa foi uma peça do acelerador de Félix da Costa não estar em conformidade com os regulamentos e promoveu Rowland à sua primeira vitória do ano com a Nissan. Dan Ticktum brilhou com o seu ERT (quando tinha começado 16º), acabando logo atrás de Maximilian Günther (Maserati). Melhor sorte que Sette Câmara que foi penalizado em 50 segundos por consumo excessivo.

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Qualificação: 1. Evans \ 2. Vergne \ 3. Wehrlein \ 4. Müller \ 5. Rowland (Ver melhores momentos)

Resultado: 1. Rowland \ 2. Dennis \ 3. Günther \ 4. Ticktum \ 5. Evans \ 6. Vergne \ 7. Nato \ 8. Vandoorne \ 9. Fenestraz \ 10. di Grassi (Ver melhores momentos)

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Ronda 7 – ePrix de Misano (2) 2024

Ainda de ressaca da eliminação da prova anterior e com a Porsche a defender o seu piloto da desclassificação, a marca alemã chegou ao domingo desertinha de vingar-se da derrota na secretaria que lhe fora imposta. Mas para isto não pôde contar com Félix da Costa, que viu a sua melhor tentativa de qualificação ser eliminada, partindo de último, recuperando até 11º, e acabando por perder a asa da frente na confusão e terminando em último…

Assim, coube a Wehrlein representar a marca de Estugarda numa luta pela vitória que novamente se quedou principalmente com o Andretti de Dennis, com participação especial do Jaguar de Cassidy. Wehrlein segurou os rivais para vencer em Misano, enquanto que Rowland (que andou nos lugares da frente novamente) se viu sem energia na penúltima volta e abdicou da possibilidade de sair líder destacado de Itália.

Assim, quem conseguiu terminar em 4º lugar foi Nico Müller, que ao contrário de no sábado conseguiu segurar rivais com equipamento consideravelmente melhor para dar pontos preciosos à ABT. Sacha Fenestraz desta vez conseguiu estar uns furos mais próximo do ritmo do seu líder de equipa Nissan (Rowland), seguido de perto de Sérgio Sette Câmara que completou um fim-de-semana positivo para a ERT.

A McLaren voltou a provar que simplesmente não tem ritmo de corrida comparável ao seu de qualificação, com destaque para o facto de Jake Hughes ter caído de pole até 8º lugar, seguido de um Jehan Daruvala a pontuar pela primeira vez este ano e do colega de equipa Sam Bird.

O campeonato permanece mais interessante que nunca, ainda que dificilmente a reputação da categoria tenha evitado um golpe depois de mais uma desclassificação de um piloto vitorioso por motivos supérfluos.

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Qualificação: 1. Hughes \ 2. Vergne \ 3. Wehrlein \ 4. Müller \ 5. Bird (Ver melhores momentos)

Resultado: 1. Wehrlein \ 2. Dennis \ 3. Cassidy \ 4. Müller \ 5. Fenestraz \ 6. Sette Câmara \ 7. Vergne \ 8. Hughes \ 9. Daruvala \ 10. Bird (Ver melhores momentos)

Campeonato: 1. Wehrlein (89) \ 2. Dennis (89) \ 3. Rowland (80) \ 4. Cassidy (76) \ 5. Günther (63) —– 1. Jaguar (128) \ 2. Andretti (112) \ 3. Porsche (109) \ 4. Nissan (100) \ 5. DS Penske (75)

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Corrida anterior: ePrix Tóquio 2024
Corrida seguinte: ePrix Mónaco 2024





Maserati atira-se à luta pelo título – ePrix Tóquio 2024

30 03 2024

O sonho dos organizadores da Fórmula E para um ePrix japonês na capital são antigos, tão antigos quanto a própria categoria. O tradicional conservadorismo japonês relativo a inovações, a preocupação com perturbar o trânsito no país, a ambivalência da Câmara da cidade, tudo levou a avanços e recuos permanentes nas negociações para a criação da prova.

Mas 2024, com a ajuda de já ter visto em ação a categoria em locais como Jakarta, Tóquio faz a sua primeira aparição na FE. A pista será centrado no Centro de Exibições Internacional de Tóquio e fará também uso de estradas regulares, numa clara inspiração pela estratégia já utilizada por Londres na sua própria prova.

A verdadeira atração principal será a proximidade do centro de uma das mais famosas cidades do mundo, que também trará uma prova caseira para a Nissan na categoria (que anunciou alguns dias antes, o seu comprometimento com continuar na categoria para além desta geração).

ABT e Porsche viram as suas negociações não chegarem a bom porto, enquanto que a Lola e Yamaha já anunciaram a sua aliança para uma estreia na Fórmula E em 2025.

Ronda 5 – ePrix de Tóquio 2024

Desde o princípio do fim-de-semana que dava para ver que a Maserati tinha em Maximilian Günther um sério candidato a obter pela primeira vez a vitória em 2024. O alemão tinha feito o seu caminho em qualificação, liderando o seu grupo e depois encaminhando-se até à final. O duelo com o Nissan da casa de Oliver Rowland foi uma competição incrivelmente renhida, que terminou com 24 milésimas de segundo de vantagem sobre Günther.

Um contratempo piorado por uma partida mais fraca para a corrida, em que Edoardo Mortara (Mahindra) conseguiu ultrapassá-lo. Com um ritmo forte no seu Maserati, Günther teve uma prova de paciência pela frente, acabando por conseguir em diferentes momentos ultrapassar primeiro Mortara e depois Rowland para vencer o primeiro ePrix de Tóquio.

Rowland dificilmente terá ficado demasiado preocupado. Regressado à Nissan este ano, o britânico acumula dois pódios consecutivos que o deixam a apenas 9 pontos do novo líder do campeonato (Pascal Wehrlein da Porsche) e ajudam a Nissan a subir a 4ª no campeonato de equipas.

Wehrlein, vencedor da primeira prova do ano, tem conseguido pontuar em todas as restantes provas, parecendo estar a adotar uma estratégia de consistência que o viu terminar em 5º e recuperar a liderança do campeonato. O colega, António Félix da Costa, passou a prova dele bem próximo e até ameaçou conseguir um pódio, só que não escolheu o melhor momento de atacar Rowland, sendo novamente passado por Jake Dennis (Andretti), sendo 4º no final.

Norman Nato (Andretti) terminou 6º, enquanto que a segunda linha da grelha (Mortara e Sergio Sette Câmara [ERT]) teve vida bem mais difícil na corrida. Mortara não viu a bandeira de xadrez, enquanto que Sette Câmara viu a falta de ritmo da ERT explorada a fundo pelos rivais (mas conseguindo ainda segurar o último ponto).

Nick Cassidy (Jaguar) acabou por minimizar os estragos de uma qualificação em 19º ao chegar em 8º, especialmente importante dado o abandono do colega Mitch Evans que perdeu a frente quando arriscou em demasia numa manobra de ultrapassagem. Destaque ainda para a forma como Nico Müller se qualificou e classificou em 7º, permitindo à ABT abrir a conta do ano (antes mesmo da fornecedora de propulsores, a Mahindra).

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Qualificação: 1. Rownlad \ 2. Günther \ 3. Mortara \ 4. Sette Câmara \ 5. Dennis (Ver melhores momentos)

Resultado: 1. Günther \ 2. Rowland \ 3. Dennis \ 4. Félix da Costa \ 5. Wehrlein \ 6. Nato \ 7. Müller \ 8. Cassidy \ 9. Frijns \ 10. Sette Câmara (Ver melhores momentos)

Campeonato: 1. Wehrlein (63) \ 2. Cassidy (61) \ 3. Rowland (54) \ 4. Dennis (53) \ 5. Günther (48) —– 1. Jaguar (100) \ 2. Porsche (83) \ 3. Andretti (70) \ 4. Nissan (62) \ 5. DS Penske (57)

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Corrida anterior: ePrix São Paulo 2024
Corrida seguinte: ePrix Misano 2024

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Fontes:
FE \ Nissan junta-se à Gen 4
Grande Prêmio \ Porsche e ABT não se entendem
Motorsport BR \ Lola e Yamaha juntam-se em 2025
Racing Circuits \ Tóquio





O décimo round da Fórmula E

7 01 2024

A décima temporada da história da Fórmula E começa dentro de uma semana e é seguro dizer que desde a primeira temporada que não se questionava de forma tão aberta o caminho que a categoria tem vindo a seguir.

A remoção de Roma do calendário por troca com um circuito permanente como Misano foi comunicada como uma ótima novidade, mas recebida com consternação. Sendo normal haverem substituições temporárias nas pistas, não escapou a ninguém que Portland está a começar a ter um ar permanente quando deveria ser um mero substituto provisório de Nova Iorque. Cidade do Cabo, Hiderabade e Jakarta caíram do ano passado para este. A China, palco da primeira corrida da categoria, está de regresso no circuito permanente de Shanghai.

Algumas das estruturas já fizeram saber que não apreciam que das 10 localizações do próximo ano tenhamos 4 em circuitos regulares em vez de citadinos. Quando a FE se tem conseguido destacar positivamente pela presença massiva de construtoras automóveis (depois do susto da saída de Audi e Mercedes), fariam bem em perceber as queixas. Dois dias de testes de pré-temporada interrompidos por um estranho incêndio de garagem também causaram estranheza.

Nem tudo são más notícias. O título mundial de Jake Dennis foi popular dentro do paddock e conseguido apenas na última ronda dupla, por uma equipa privada, reanimando os ânimos de que é possível a quase qualquer estrutura (com o orçamento e capacidade técnica certos, claro) conseguir ser bem-sucedida na categoria elétrica.

E corridas de pelotão à parte, houve momentos altos da ação em pista dos novos Fórmula E de 3ª geração em 2023. O segundo ano promete mais.

Que vida para os protagonistas de 2023?

Se haviam dúvidas sobre como Porsche e Jaguar lidariam com verem as suas clientes (Andretti e Envision, respetivamente) baterem-nas, a resposta parece ter sido simples: consolidação. A Porsche manteve a sua dupla de Pascal Wehrlein e António Félix da Costa, tentando saber manter o ritmo de desenvolvimento do seu motor elétrico. A Jaguar segurou Mitch Evans e foi “roubar” Nick Cassidy à sua cliente, procurando ter dois pilotos fortes no seu seio.

A julgar pelos testes, em que ficaram com o Top 3 da classificação em Valência, promete dar certo a sua aposta. Para Andretti e Envision, trata-se agora de uma questão de conseguir não perder o “comboio” que têm vindo a utilizar desde o início do ano passado (e até um pouco antes).

A Andretti tem como trunfo o campeão em título (Jake Dennis) e foi buscar Norman Nato à Nissan, de forma substituir o errático André Lotterer. Nos testes a aclimatização não foi inteiramente ideal, com um 9º e 12º lugares. Já a Envision perdeu o seu melhor trunfo, mas manteve um rejuvenescido Sébastien Buemi e foi buscar um ex-piloto sob a forma de Robin Frijns. Ambos colocaram-se no Top 10 de Valência.

O meio da tabela

Atrás destas 4 equipas ficaram duas estruturas do grupo Stellantis, que apostam em continuidade. A DS teve um primeiro ano moderadamente positivio com a Penske e a dupla de campeões manter-se-á em 2024 (Jean-Éric Vergne e Stoffel Vandoorne) à espera de melhores oportunidades.

Já a colega Maserati, também em primeira ano de parceria (com a Venturi) teve que proceder a alterações inesperadas. Edoardo Mortara, de pedra e cal há vários anos, teve que sair por uma completa incapacidade em obter resultados relevantes (será substituído pelo estreante Jehan Daruvala) e Maximilian Günther apanhou todo o paddock de surpresa com um brilhante ano (recompensado pela sua manutenção).

Os testes foram inconclusivos para ambas.

Já a Nissan e a sua cliente McLaren chegam com ambições mistas para 2024. A Nissan fez uma cópia da Envision, por assim dizer: perdeu o seu piloto principal (Nato) e segurou a prata da casa (Sacha Fenestraz), indo buscar um ex-piloto da sua casa que já viu melhores dias (Oliver Rowland, que regressa amassado da sua experiência na Mahindra).

A McLaren, a usar motores dos japoneses, até tinha começado bem 2023 (ou não fosse a “reencarnação” da estrutura oficial da Mercedes) mas foi perdendo ritmo ao longo do ano. Começar bem 2024 é prioritário, sendo por isso que foram buscar um experiente Sam Bird para acompanhar um Jake Hughes que fez boa figura na sua estreia de laranja no ano passado.

Rowland foi o único a conseguir colocar-se no Top 10 nos testes, mas os sinais não foram maus.

Quem precisa de reformular tudo

Assim, sobra quem teve anos terríveis em 2023. Ou, pelo menos, continuações de períodos de performances pouco impressionantes.

A grande derrotada foi mesmo a Mahindra, que percebeu que seriam necessárias alterações enormes. A primeira preocupação é garantir que não volta a suceder nada com a gravidade da falha do sistema de suspensão da Cidade do Cabo, ainda que as regras de homologação de monolugar lhes possa dificultar a vida. Não foi por acaso que perderam ambos os pilotos, com Lucas di Grassi a terminar o seu contrato antes de tempo.

Para 2024 apostaram numa dupla de pilotos que ao longo do último ano deixaram bastante a desejar em 2023 mas que quer voltar a mostrar serviço: Edoardo Mortara, que se perdeu na Maserati, e Nyck de Vries, que nunca se encontrou na F1 com a AlphaTauri. O talento dos dois é mais que suficiente, no entanto resta ver como se recuperam. O Top 10 nos testes de Mortara é um sinal positivo.

Já a ABT deve estar arrependido de se ter “atrelado” à Mahindra no seu regresso à FE, contudo manteve os préstimos de Nico Müller e foi buscar o experiente campeão Lucas di Grassi para relançar-se com novo fôlego para 2024.

A NIO, que passou a ERT, manteve a sua dupla (Dan Ticktum e Sérgio Sette Câmara) e procurará fazer de um 2023 em que voltou a pontuar com mais frequência uma base para almejar regressar a uma posição mais forte em 2024.





Top 10 da Fórmula E 2023

6 08 2023

Não deixa de ser irónico que num ano em que apenas duas corridas não foram vencidas por monolugares equipados por Porsche ou Jaguar, ambas as marcas tenham tido um ano extremamente frustrante. É que ambos os títulos pertenceram a equipas clientes de ambas, deixando os chefes de equipa com conversas bastante constrangedoras a ter na sua avaliação de desempenho com a casa-mãe.

A Jaguar deu tiros nos próprios pés, com Sam Bird a eliminar o colega de prova duas vezes e mesmo Mitch Evans acidentou-se sozinho num momento crítico, mas a Porsche dificilmente tem uma justificação tão simples. Mesmo com a contratação de António Félix da Costa para dar a Pascal Wehrlein uma concorrência mais próxima, a equipa parece incapaz de desenvolver o seu carro ao longo de uma temporada de forma eficaz.

A Andretti foi uma estrutura de um só carro (André Lotterer foi humilhado com apenas 23 pontos contro os 229 do colega campeão, Jake Dennis), a Envision viu um título de construtores premiar a dupla mais competente do ano e a DS Penske fez um sólido primeiro ano de cooperação (vencendo a sua primeira corrida).

Mas foi também um ano de grandes desilusões. A Mahindra falhou por completo o ano, culiminando num problema de suspensão que os obrigou a abandonar uma prova antes de partir e arrastando a cliente ABT para os dois últimos lugares na grelha. Oliver Rowland bateu com a porta na Mahindra antes do ano terminar, enquanto que Robin Frijns foi anónimo na ABT (além de ter partido um pulso na ronda inaugural).

Enquanto isso, a McLaren foi procurando arranjar o seu espaço fora da esfera Mercedes, a Nissan e NIO parecem finalmente estar no caminho da recuperação e a Maserati transformou o seu início penoso numa estrutura capaz de pontuar com regularidade e até vencer (ainda que Edoardo Mortara tenha sido um surpreendente peso morto).

1 – Nick Cassidy

Geralmente uma presença discreta ao lado de rivais mais badalados, Nick Cassidy estreou-se na Fórmula E em 2021 com a Envision ao lado do cotado Robin Frijns e foi construindo o seu espaço com 2 pódios e 2 poles. Mesmo entre os estreantes do ano, Cassidy não passou para o topo da lista de ninguém, e apesar da primeira vitória na categoria em 2022, o neozelandês voltou a ser batido internamente por Frijns.

A saída do neerlandês pela entrada do campeão Sébastien Buemi e o estatuto de equipa privada da Jaguar por parte da Envision pareciam limitar naturalmente a progressão de Cassidy. Mas alguém se esqueceu de informar o piloto disso.

Com uma consistência de pontuações notável, o neozelandês perdeu pontos para Buemi nas 3 primeiras provas, mas depois arrumou o novo colega a um canto dentro de pista (5 pódios em 6 provas contra 0 em 6) e fora de pista (a maneira como gozou com o suíço pela rádio depois de um incidente entre ambos foi um golpe de mestre, dada a irritabilidade fácil de Buemi). Vitórias em Berlim, Mónaco e Portland colocaram-no firmemente na luta pelo título, e apenas em Jakarta pareceu perder a compostura.

Nas 3 provas finais foram 2 abandonos e uma vitória de ponta a ponta. Nenhum dos dois abandonos foi culpa própria: num foi eliminado por Mitch Evans e no outro pelo colega de equipa. Sem estes contratempos teria muito provavelmente sido campeão.

2 – Jake Dennis

Ninguém esperaria que o título de campeão na primeira temporada da terceira geração de carros de Fórmula E terminasse com uma disputa entre dois pilotos de equipas privadas, e muito menos que a primeira prova do ano caísse nas mãos de uma Andretti como nova cliente da Porsche.

Habituado a ser subestimado desde a sua primeira temporada na categoria, Jake Dennis voltou a ser o líder indiscutível dos americanos, com uma sequência impressionante de terminar no pódio todas as corridas em que pontuou (com exceção da primeira prova de Roma). Não que isto tenha sido sempre por consistência pura. Ao longo do ano foi visível a frustração do britânico com os constantes pódios sem vitória e com a gestão de energia necessária para se manter em disputa pela vitória.

Mas foram precisamente os pódios constantes e a boa gestão de consumo que deixaram Dennis sempre na frente do campeonato ou próximo, enquanto os rivais tropeçavam constantemente. Quando a hecatombe da segunda prova de Roma eliminou os seus rivais, também foi assim que soube estar em posição perfeita para vencer pela primeira vez desde a prova inaugural.

O título mundial foi um justo prémio para a sua consistência de ouro.

3 – Maximilian Günther

É difícil identificar um piloto com a cotação tão baixa quanto a de Maximilian Günther no início deste ano. Tendo provado ser capaz do melhor e do pior na BMW e tendo sido batido em toda a linha por Sébastien Buemi na Nissan em 2022, o alemão só conseguiu um lugar na nova estrutura Maserati porque Nyck de Vries foi chamado para a Fórmula 1. E mesmo assim, só por um ano. Quando na primeira metade do ano o Maserati provou ser lento e pouco fiável, ninguém se surpreendeu de ver o piloto a zeros.

Mas quando a marca italiana começou a mostrar rendimento a meio do ano, começando em Berlim, muitos ficaram surpresos por ver que o primeiro pódio da marca histórica não pertenceu ao sempre consistente Edoardo Mortara, mas sim a Günther. Com a exceção de um abandono desnecessário (incidente com Ticktum) no Mónaco, Günther classificou-se entre os 6 primeiros em 4 das 5 corridas que se seguiram, com direito a 3 pódios e à primeira vitória Maserati em Jakarta.

Com mais de metade dos pontos de Mortara, Günther colocou um problema à Maserati, que apenas o tinha preso a um contrato de um ano e agora terá que correr para o renovar sob pena de ficar com um Mortara bastante desmotivado apenas.

4 – Jean-Éric Vergne

Em quase permanente ligação com as marcas francesas do grupo Stellantis, Jean-Éric Vergne acompanhou a DS na sua saída da Techeetah em favor da pouco competitiva Penske. Seria sempre expectável que a nova DS Penske tivesse uma melhoria da sua performance, mas também que os dois campeões (Vergne e o colega Stoffel Vandoorne) tivessem dificuldade em simplesmente continuarem nos lugares cimeiros.

O que ninguém teria esperado era que, depois de três provas a roçar o fundo da tabela de pontuação, Vergne mostrasse tenacidade suficiente para segurar uma porção significativa dos pilotos do grid em fila única atrás de si em Hiderabade para dar à DS a única vitória do ano.

O resto de ano foi feito de conquistas um pouco mais modestas mas igualmente notáveis, com 2 pódios adicionais e pontuando em mais de metade das provas. O facto de ter terminado com mais de metade dos pontos do colega (que era o campeão em título e melhor piloto dos últimos dois anos) só demonstra bem a dimensão da temporada de Vergne. Assim que tiver carro para mais nos próximos anos deverá ser uma dor de cabeça séria para todos os rivais.

5 – Mitch Evans

Foi talvez o ano mais frustrante da carreira de FE de Mitch Evans, o que é dizer algo. Depois de 6 anos em que integrou uma equipa Jaguar a aproximar-se pouco a pouco da luta pelos lugares da frente, o neo-zelandês foi 3º em 2021, vice-campeão em 2022 (com mais 3 vitórias que o campeão) e em 2023 poderia muito bem ter sido a vez do homem da Jaguar.

Mas as coisas não correram dessa forma. Os enormes talentos de Evans voltaram a estar à vista de todos, com 3 vitórias e 5 pódios, assim como a maneira como voltou a arredar Sam Bird a um canto (acabando com a carreira do colega na equipa, quando havia chegado como um dos melhores da categoria). A má forma no início do ano da equipa e o facto de Bird o ter eliminado em 2 (!) corridas diferentes ditaram mais um título escapado.

Porquê não estar mais acima nesta tabela? Simples. Ao contrário dos outros anos, houve quem mostrasse mais consistência e, especialmente, sangue frio. Depois de uma vitória na primeira corrida de Roma, Evans via-se numa luta a 3 com Dennis e Cassidy quando deitou tudo a perder com uma travagem mal calculada na segunda volta, que entregou o título de bandeja. Mais frieza para evitar um erro imperdoável destes é necessária.

6 – Pascal Wehrlein

Há muito à espera da oportunidade de conseguir estar com consistência entre os primeiros classificados da categoria, Pascal Wehrlein viu-se nas primeiras 4 provas do ano com um Porsche que conseguiu aproveitar extremamente bem as novas regras para dominar e não desapontou: foram 2 vitórias e 3 pódios.

Deveria ter sido o momento certo para começar a fugir no campeonato, até porque o principal rival era Jake Dennis com propulsores da Porsche também, mas o alemão acabaria por sofrer com uma performance muito difícil do carro em qualificação. Os carros da marca alemã até tinham ótimo ritmo de corrida que permitia recuperar posições, mas a desvantagem deixava Wehrlein a não conseguir imiscuir-se no Top 6. E assim os rivais retomaram a iniciativa.

O facto de o novo colega, António Félix da Costa, ter pontuado melhor nesta fase difícil não abonou a favor de Wehrlein. Ainda assim, uma nova vitória em Jakarta ajudou a retomar a iniciativa no combate pelo título. Mas a maneira como se foi tornando mais anónimo à medida que a Porsche perdia rendimento deixa um ponto de interrogação.

7 – António Félix da Costa

Qualquer possibilidade que pudesse existir de António Félix da Costa conseguir competir pelo título em 2023 desapareceu ao fim de 3 corridas, Ainda a adaptar-se na sua estreia com uma equipa nova (e ainda por cima regulamentos diferentes), o português viu o seu colega na Porsche (Wehrlein) assumir os comandos da estrutura com 2 vitórias e um segundo lugar em 3 provas. No mesmo período, tinha apenas pontuado 6 pontos na primeira prova do ano.

Era preciso reagir, e Félix da Costa conseguiu dissipar dúvidas sobre o seu nível de performance com uma vitória na estreia da Cidade do Cabo no calendário, conseguindo vencer com a equipa alemã ao fim 5 cirrudas quando o homem que substituiu (Lotterer) não o fez em 3 anos. A partir daqui o ritmo dos dois pilotos equilibrou por completo, mas a distância na tabela de classificação tornava inevitável a secundarização do português até ao final do ano.

Mesmo quando admitiu publicamente necessitar de ser segundo piloto até ao final do ano, Félix da Costa deixou claro que não seria a qualquer custo. Quando Wehrlein circulava no final do Top 10 em Portland, o colega não se deixou preocupar: atacou Dennis e Cassidy até ao final pela vitória, encurtando pouco a pouco a distância para o outro Porsche no campeonato.

As 4 rondas finais acabaram por ser dolorosas (uma delas literalmente com um acidente em Roma), particularmente a desclassificação por motivos técnicos de Londres quando tinha recuperado de 17º a 2º.

8 – Dan Ticktum

De temperamento explosivo, rasgos ocasionais de grande velocidade, uma inteligência táctica por vezes questionada e ao volante de um NIO 333 que fora penúltimo em 2022, Dan Ticktum não estava no radar de muitos na antevisão de 2023.

Só que o britânico acabou mesmo por ser um dos pilotos mais impressionantes do ano. Ainda sem ritmo para grandes voos, mas marginalmente melhor que o antecessor, o NIO conseguiu almejar lutar por pontos com alguma frequência nas mãos de Ticktum. Um pequeno 10º lugar na terceira prova do ano foi para abrir o apetite, mas chegou ainda um ótimo 6º na Cidade do Cabo. Após Berlim voltou a haver espaço para um novo 6º, a segurar o pelotão.

E nas 3 provas finais, uma delas sob chuva torrencial, 3 pontuações com um 9º, um 7º e outro 9º. Isto permitiu a Ticktum acabar com o dobro dos pontos do colega Sérgio Sette Câmara (e a maioria dos pontos deste vieram de um único resultado), sendo líder incontestado e garantindo o melhor resultado da NIO no campeonato desde 2017-18.

Porquê tão para baixo? Simples: Ticktum continua a ser o seu pior inimigo fora de pista. Quando as coisas não corriam bem, o piloto não hesitou em culpar a equipa (uma das vezes gritando com o engenheiro pelo rádio, enquanto dizia que não compareceria no briefing e pedindo um táxi…). Uma estratégia que vai dificultar as suas possibilidades de obter um lugar melhor na categoria.

9 – Sébastien Buemi

Havia muito a provar para Sébastien Buemi em 2023. Desde a primeiríssima temporada da categoria elétrica que o suíço estava envolvido na estrutura da DAMS sob as suas formas Renault e Nissan, pelo que a mudança para a Envision era interessante por si só. Juntando a isto o facto de há duas temporadas o rendimento de Buemi estar bem abaixo do esperado, depois de já ter sido campeão (2015-16) e vice-campeão (3 vezes), e era grande a expectativa de ver como reagiria.

E a reação foi positiva. No novo ambiente de equipa privada, Buemi começou o ano com 6 pontuações diferentes e 7 corridas, aproveitando a boa forma da nova equipa, além de se ter começado a restabelecer como piloto confiável e regular durante o resto do ano.

Como pontos negativos, pode-se falar de ter sido amplamente batido por Cassidy (que não se deixou intimidar com as reclamações do suíço) e de não ter chegado ao pódio. Mas ter sido um eficaz segundo piloto quando Dennis teve que se contentar com Lotterer já é um grande feito para quem vinha de temporadas tão ineficazes. Agora resta construir um 2024 mais promissor com base num sólido 2023.

10 – Norman Nato

Tendo competido como estreante na Venturi em 2021, com um início particularmente difícil, Norman Nato viu uma vitória na corrida final do ano ser recompensado com… ficar sem lugar. Fazendo uma “perninha” nas duas rondas finais em 2022 pela Jaguar, Nato acabou por merecer o seu regresso com a Nissan para este ano.

Parecia uma excelente prenda, este lugar numa equipa de fábrica com um colega quase estreante, só que podia muito bem ter sido um cálice envenenado com a estrutura que já fora campeã a perder ritmo há várias temporadas e a ficar sem ambos os pilotos no fim de 2022. A primeira corrida até começou com um abandono num incidente em que Robin Frijns ficou com um pulso partido.

Acumulando pontos como pôde na primeira metade do ano, e com a cliente da Nissan (McLaren) a pontuar melhor, Nato soube gerir de forma brilhante as suas provas até que um ótimo 5º lugar em Jakarta provou ser a sua rampa de lançamento para não voltar a largar os pontos. Inclusivamente obteve em Roma o primeiro pódio da Nissan em dois anos, acabando o ano com quase o dobro dos pontos do colega.

A Nissan viu-se assim na frente da McLaren e Nato poderá conseguir ainda melhores resultados em 2024 se a equipa prosseguir a sua trajetória ascendente.





Na Alemanha só vencem neozelandeses – ePrix Berlim 2023

23 04 2023

O Aeroporto de Tempelhof já tem um lugar reservado na História do mundo, como palco da famosa ponte aérea que os norte-americanos estabeleceram em Berlim durante a Guerra Fria, mas nos últimos anos tem-se transformado num dos mais conhecidos palcos da Fórmula E, com direito a decisões de título, provas caóticas e um traçado desafiante.

Utilizado pela primeira vez em 2015, o circuito foi alterado substancialmente a partir da sua segunda edição para a configuração atual (que até já foi corrida em sentido inverso). No seu total são 2,250 km de extensão e 10 curvas que os pilotos têm que negociar, com a vantagem de que têm os muros substancialmente mais longe do que nas outras provas da FE. As desvantagens são a falta de aderência e elevado consumo de pneus do traçado abrasivo.

Como ronda dupla novamente, Berlim surge no calendário como primeira prova europeia do ano e um mês após o ePrix de São Paulo (devido a alguns cancelamentos de última hora). Antes das provas de 2023, 3 pilotos partilhavam o maior número de vitórias (2): Sébastien Buemi, Lucas di Grassi e António Félix da Costa.

Ronda 7 – ePrix de Berlim (1) 2023

A qualificação para a primeira prova alemã trouxe duas caras bem familiares para o duelo final: Sébastien Buemi e Sam Bird competiram para no final ser Buemi quem levou a melhor (tornando-se o recordista absoluto da Fórmula E).

Na partida para a corrida, no entanto, foi Dan Ticktum quem surpreendeu toda a gente ao partir de 4º cheio de vontade, passando Buemi por fora na longa primeira curva para colocar a NIO na frente. Com a sucessão de Attack Modes acabaria por perder essa liderança, mas quando a prova ia a meio ainda estava em competição. Até que se esqueceu de verificar o exterior de uma curva onde Stoffel Vandoorne já se encontrava. O resultado foi que ambos terminaram aí os seus dias, ficando a discutir acesamente na berma da estrada.

Isto gerou um período de Safety Car, que viu os dois Jaguar e Buemi disputarem a vitória após o recomeço. Buemi, que também utilizava propulsores da Jaguar, ainda continuou a fazer o seu melhor para segurar um potencial primeiro triunfo com a Envision, mas acabou por sucumbir a um ataque bem temporizado de Mitch Evans. A última volta não ajudou: Sam Bird roubou o 2º posto de forma limpa e Maximilian Günther roubou de forma aparatosa o 3º.

O resultado final foi uma dobradinha bem saborosa para a Jaguar e um primeiro pódio para a Maserati, que deve ter deixado a antiga Venturi bem aliviada (até porque Edoardo Mortara também pontuou). Pascal Wehrlein ainda conseguiu limitar os estragos, enquanto que Nick Cassidy chegou em 5º, para mais um bom resultado conjunto da Envision em 2023.

António Félix da Costa partiu de 19º mas, a 8 voltas do fim, já tinha recuperado até ao 4º posto quando uma travagem completamente falhada por Jake Dennis atirou o homem da Andretti em cheio contra o Porsche do português e lhe terminou a prova.

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Qualificação: 1. Buemi \ 2. Bird \ 3. Vandoorne \ 4. Ticktum \ 5. Dennis (Ver melhores momentos)

Resultado: 1. Evans \ 2. Bird \ 3. Günther \ 4. Buemi \ 5. Cassidy \ 6. Wehrlein \ 7. Vergne \ 8. Lotterer \ 9. Mortara \ 10. Rowland (Ver melhores momentos)

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Ronda 8 – ePrix de Berlim (2) 2023

Com piso molhado até ao final de qualificação, a segunda prova de Berlim trouxe como surpresa o facto de a ABT ter conseguido fechar a primeira linha da grelha para o ePrix, com o experiente Robin Frijns a vencer o colega de equipa Nico Müller na final. O tempo seco, no entanto, acabou por significar que os monolugares alemães começaram a cair ao longo da prova até que apenas Müller conseguiu pontos em 9º.

Fazendo uso do ritmo do seu Envision, acabou por ser Nick Cassidy quem conseguiu vencer em Berlim, depois de reclamações bem sonoras no rádio contra Buemi durante a qualificação. O neozelandês (mais uma triunfar na Alemanha em 2023) terminou na frente de alguém que precisava de compensar a sua terrível primeira prova: Jake Dennis.

A completar o pódio chegou Jean-Éric Vergne da DS Penske, que parece estar a ganhar embalo para o seu ritmo dos anos recentes Techeetah. Evans voltou a somar pontos importantes para se aproximar da luta pelo título, enquanto que os Porsche voltaram a fazer uma pontuação dupla em território caseiro.

A Maserati conseguiu pontuar pela segunda prova seguida, cortesia de Günther, enquanto que Ticktum compensou um pouco o disparate de sábado ao amealhar o último lugar pontuável de domingo.

De destacar ainda a interrupção momentânea da partida devido a protestantes que entraram em pista e tentaram interromper os procedimentos, apesar de terem sido corridos do traçado com alguma rapidez pelos seguranças. Os protestantes pelo clima conseguiram a proeza de interromper um evento de veículos elétricos que se orgulha do seu estatuto carbon neutral

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Qualificação: 1. Frijns \ 2. Müller \ 3. Buemi \ 4. Vergne \ 5. Evans (Ver melhores momentos)

Resultado: 1. Cassidy \ 2. Dennis \ 3. Vergne \ 4. Evans \ 5. Félix da Costa \ 6. Günther \ 7. Wehrlein \ 8. Vandoorne \ 9. Müller \ 10. Ticktum (Ver melhores momentos)

Campeonato: 1. Wehrlein (100) \ 2. Cassidy (96) \ 3. Vergne (81) \ 4. Dennis (80) \ 5. Evans (76) —– 1. Porsche (168) \ 2. Envision (153) \ 3. Jaguar (138) \ 4. DS Penske (107) \ 5. Andretti (103)

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Corrida anterior: ePrix São Paulo 2023
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ePrix Berlim seguinte: 2024





No meio do caos, dá Félix da Costa – ePrix Cidade do Cabo 2023

27 02 2023

Já há algum tempo que as categorias do automobilismo têm compreendido a incongruência de se apelidarem de campeonatos mundiais sem que passem pelo continente africano. Como país com melhores índices económicos e de desenvolvimento humano em África, a África do Sul é geralmente a responsável pela organização destes eventos, só que tanto a nível de F1 como de FE tem demorado a conseguir oficializar um acordo. Acordo que a torna a sucessora de Marrocos como prova africana da categoria.

A estreia do país na Fórmula E foi feita num circuito citadino na Cidade do Cabo, que passará pelos distritos de Green Point e Waterfront a velocidades que o tornaram um dos circuitos com maior média de velocidade na temporada (e uma das melhores oportunidades para os novos monolugares “esticarem as pernas”).

Com a Montanha da Mesa a fazer de fundo para a ação, os pilotos iriam competir ao longo dos 2,74 km e 12 curvas para ver quem conseguiria triunfar num traçado com menos chicanes que o usual para os padrões da Fórmula E.

Ronda 5 – ePrix da Cidade do Cabo 2023

Quando aparece qualquer classificação de uma corrida em que apenas terminam 13 dos 22 carros inscritos, compreende-se que o caos foi garantido.

O primeiro percalço foi logo antes do início das sessões oficiais, com a Mahindra a anunciar que tinha detetado uma flexão pouco natural e muito perigosa na suspensão traseira dos 4 carros (os oficiais e os ABT), o que forçou a equipa a terminar precocemente a sua participação no fim-de-semana (e a fazer Lucas di Grassi pela primeira vez faltar a uma prova).

Juntando a isto incidentes vários ao longo da prova, que começou logo na primeira volta a provocar estragos, e percebe-se um pouco melhor como António Félix da Costa conseguiu ascender do seu 11º lugar na partida até à vitória final. Não totalmente por motivos alheios, uma vez que o português fez uso pleno da boa forma do seu Porsche para ir passando adversários um a um, culminando numa excelente ultrapassagem sobre o antigo colega de equipa da DS (Jean-Éric Vergne).

Com Pascal Wehrlein e Jake Dennis mais uma vez em sarilhos, isto significou que Félix da Costa e Vergne se aproximaram dos outros dois como os mais diretos perseguidores na corrida do título.

Nick Cassidy e Sébastien Buemi terminaram em 3º e 5º, respetivamente, para provar que as unidades da Jaguar são competitivas apesar das dificuldades da equipa oficial, e a McLaren fez o mesmo em relação à Nissan (que apesar de ter feito uma inesperada pole position com Sacha Fenestraz acabou por sair da Cidade do Cabo com apenas 4 pontos.

Melhor, ainda assim, que a Maserati, que viu Maximilian Günther desperdiçar uma oportunidade de ouro para bons pontos com uma cambada de erros pouco vistosos que o levaram a partir a direção do carro contra o muro. A equipa italiana permanece com apenas 3 pontos neste campeonato.

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Qualificação: 1. Fenestraz \ 2. Günther \ 3. Cassidy \ 4. Evans \ 5. Vergne (Ver melhores momentos)

Resultado: 1. Félix da Costa \ 2. Vergne \ 3. Cassidy \ 4. Rast \ 5. Buemi \ 6. Ticktum \ 7. Vandoorne \ 8. Nato \ 9. Lotterer \ 10. Hughes (Ver melhores momentos)

Campeonato: 1. Wehrlein (80) \ 2. Dennis (62) \ 3. Vergne (50) \ 4. Félix da Costa (46) \ 5. Cassidy (43) —– 1. Porsche (126) \ 2. Venturi (84) \ 3. Andretti (80) \ 4. McLaren (66) \ 5. DS Penske (61)

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Corrida anterior: ePrix Hiderabade 2023
Corrida seguinte: ePrix São Paulo 2023

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Fontes:
The Race \ Mahindra retira carros





Muitas incógnitas na Gen 3 da Fórmula E

7 01 2023

Já são três temporadas consecutivas em que as temporadas de Fórmula E, que deveriam incluir dois anos do calendário, incluem apenas um único ano. A pandemia provocou o caos na logística da categoria elétrica e os estragos ainda se notam na idealização do calendário. Ainda não foi este ano que se viu a temporada 2022/23. O que deve ter sido motivo para grandes festejos, dado o nascimento difícil dos novos carros de FE, os Gen 3.

Uma sessão de pré-temporada em Valência nem sempre revela demasiado, uma vez que se trata de um tipo de circuito que os monolugares raramente enfrentam durante a temporada. Desta vez, no entanto, serviu para dar um alerta geral às equipas: a fiabilidade dos novos modelos está pelas ruas da amargura…

Para além das preocupações gerais com quantos carros conseguirão de facto chegar ao fim da prova da Cidade do México, os pilotos têm reportado que a potência extra e menor peso não se estão a traduzir em ganhos significativos de performance (para já) e, mais grave, já ocorreram alguns incidentes em pista de impactos fortes (para grande irritação de pilotos como Sébastien Buemi).

Nem tudo são más notícias. Estruturas novas entrarão em ação este ano, com apoios oficiais de construtoras automóveis, as credenciais verdes da categoria não param de subir, há duplas de pilotos extremamente interessantes, e uma margem de progressão potencialmente grande no que toca a desbloquear o potencial dos novos monolugares (e dos novos pneus Hankook).

A Mercedes saiu e agora?

Costuma ser incomum ver um piloto de automobilismo abandonar a categoria no ano a seguir a conquistar o título, mas ainda mais incomum é que uma equipa inteira abandone a competição como bicampeã em título.

A estrutura da equipa alemã não saiu propriamente por vontade própria, tendo que ceder o seu espaço na grelha por vontade da casa-mãe de Estugarda. Os seus dois pilotos sumiram-se (o campeão de 2022, Vandoorne, para a DS Penske e o campeão de 2021, de Vries, para a F1), mas Ian James, o chefe da equipa, pareceu decidido a não ter o mesmo fim que a Audi na FE. Negociando com a McLaren e o projeto Neom (da Arábia Saudita), James conseguiu transformar-se numa equipa cliente (os propuslores foram contratados à Nissan) e conseguiu os serviços de pilotos como René Rast e Jake Hughes para solidificar o projeto.

A recompensa por estes esforços é que a McLaren se apresentou como uma das equipas que mais impressionaram na curta sessão de testes de Valência, andando pelos lugares da frente e com uma quilometragem de fazer inveja às outras equipas. Resta ver como lidarão com não terem a vantagem das melhores unidades de potência ao seu serviço.

Como se comportarão os dragões, tridentes e estreantes?

Não é só a McLaren a aparecer de cara lavada em 2023.

Aparecendo como equipa privada que incomoda as de fábrica ao longo dos últimos anos, foram poucas as pessoas que não tenham ficado com uma forte expectativa de ver o que a antiga Venturi conseguiria fazer nesta transformação para estrutura oficial da Maserati (grupo Stellantis). A avaliar pelos testes de Dezembro, há razões de sobra para as rivais se preocuparem. Os italianos não só contaram com o sempre excepcional Edoardo Mortara no seu nível habitual, como ainda viram Maximilian Günther a mostrar que a sua forma no ano passado na Nissan não era motivo para preocupação.

Outra estrutura que parece não ter perdido nada com as mudanças foi a “vizinha” da Stellantis, a DS. Campeã durante 2 anos com a Techeetah, a marca francesa mudou-se para a Dragon Penske do fundo da grelha para a formar uma DS Penske que conseguiu atrair dois campeões de Fórmula E: Jean-Éric Vergne e o atual campeão, Stoffel Vandoorne. Quase nada da antiga equipa americana parece sobrar, resultando numa pré-temporada bem conseguida.

Finalmente, depois de um ano fora de competição, a ABT decidiu regressar à categoria elétrica do zero. Habituada a ser a estrutura oficial da Audi, a equipa alemã teve de se contentar desta vez em ser uma mera cliente da Mahindra, ainda que até neste ponto já tenham os olhos no futuro: a Cupra (Seat) será patrocinadora e possivelmente uma eventual fornecedora de motores. Aos comandos dos ABT andarão o consistente Robin Frijns e a incógnita Nico Müller.

Jaguar e Porsche tentam o salto definitivo

Não deixa de ser curioso que a Jaguar continue a vários níveis com a imagem de ainda não se ter juntado ao grupo das grandes estruturas da Fórmula E, quando já são alguns anos consecutivos a vencer provas na categoria e dois em que tem lutado pelo título. Das poucas equipas que não alteraram quase nada na sua estrutura para 2023, a marca britânica espera dar o passo final. Para isso conta com o piloto com mais vitórias de 2022, Mitch Evans, e espera contar com o Sam Bird confiante que esteve desaparecido nos últimos doze meses.

Pela primeira vez contarão com uma equipa cliente nas suas fileiras, tendo assinado com a Envision (depois de um longo relacionamento destes com a Audi). A Envision tem perdido algum do seu brilho de equipa da frente em anos recentes, assim como a sua ótima dupla Bird-Frijns. Mas nem tudo são más notícias: Nick Cassidy continua na equipa com que triunfou no ano passado, e o campeão Sébastien Buemi mudou de ares para recuperar a sua forma.

Já os motivos pelos quais a Porsche ainda não foi considerada uma equipa da frente não são difíceis de descortinar. Habituada a entrar numa competição e não demorar quase tempo nenhum até vencer, a Porsche apenas venceu pela primeira vez em 2022 e depois caiu de forma. Com os novos regulamentos deste ano, os alemães contam ajudar Pascal Wehrlein e o novo recruta António Félix da Costa a lutar pelos lugares cimeiros.

André Lotterer, que tinha até ao ano passado integrado a equipa, optou por se juntar a Jake Dennis na Andretti (fornecida agora pela Porsche). Os americanos têm conseguido lidar bem com a passagem de equipa oficial para equipa cliente, de tal forma que provaram a sua mais-valia para a Porsche. O que deixa no ar a ideia, conseguirão eles assumir o papel de estragar a festa à equipa principal (à semelhança da Venturi com a Mercedes).

A fugir ao fundo

Sendo verdade que as performances das novas unidades motrizes da Nissan não poderão ser questionadas, uma vez que a McLaren tem feito boa figura nos testes, perduram muitas dúvidas quanto à estrutura da equipa principal dos japoneses (principalmente desde que a DAMS abandonou os comandos ao grupo Renault). Quebrando por completo com o caminho que vinha a ser trilhado desde o início, a equipa apostou numa dupla completamente diferente para 2023, com Norman Nato (que já mostrou flashes de velocidade na categoria) e Sacha Fenestraz (que se estreará a tempo inteiro na FE, depois de ter mostrado muito valor nas categorias de promoção japonesas).

As capacidades de ambos os pilotos não estão em questão para este ano, já a habilidade de ambos para fazer ressuscitar o projeto Nissan na Fórmula E poderá ser mais complexo.

Quem não deverá contar com preocupações neste quesito é a Mahindra, que assinou com o campeão Lucas di Grassi no seu ataque às novas regras (onde se juntará à contratação do ano passado, Oliver Rowland). A equipa indiana tem procurado (com ocasional sucesso) ser produtora dos seus próprios motores de forma a ameaçar as grandes construtoras e tem vindo a aumentar as suas aspirações (como se vê pelo fornecimento à ABT). Resta ver se terão orçamento para aguentar estes desejos.

Tendo em conta tudo isto, parece difícil que não seja a NIO 333 a mais séria candidata ao fundo da grelha. A “prata da casa” que era Oliver Turvey não continuou a sua presença, mantendo-se antes Dan Ticktum (que terá internamente somado alguns pontos ao longo de 2022) com a adição de Sérgio Sette Câmara. Apesar de a qualidade de ambos não ser questionável, no contexto da Fórmula E não mostraram ainda o suficiente para poderem ser considerados pilotos de topo. Juntando a isto os baixos quilómetros acumulados em Dezembro, parece difícil que a equipa ambicione muito mais do que tem vindo a conseguir.

A nova cara da Fórmula E

Já é tradição que uma temporada de Fórmula E só esteja verdadeiramente definida quando a última corrida se avizinha, e 2023 traz mais do mesmo. As adições da Cidade do Cabo e Hiderabade tiveram os seus traçados oficiais por oficializar até menos de um mês de se realizarem as suas provas. As diversas tentativas de realizar provas em território chinês continuam a redundar em fracasso devido às políticas Covid do Governo do país. As provas de Nova Ioque tiveram que ser substituídas por uma ronda em Toronto devido a expansões nos terminais do ferry.

O resultado é um calendário com 16 em vez de 18 corridas como originalmente projetado, mas com ainda mais rondas duplas que as que idealmente gostariam.

Restando ainda ver os efeitos práticos dos novos monolugares na primeira prova do ano, sabemos já a nova imagem da Fórmula E num sentido literal, com o novo logotipo apresentado no final de 2022, que simboliza muitas das mudanças que a categoria tem feito para se legitimar (e cujo principal expoente é o fim do Fan Boost).

Para 2023, as incógnitas são muitas. Veremos quem sairá por cima na próxima semana na Cidade do México.