Pilotos suspensos ou como destruir uma Fórmula 2

25 09 2022

Consagrado com antecedência campeão da Fórmula 2, Felipe Drugovich almeja conquistar um espaço na Fórmula 1 para 2023. A sua melhor hipótese aparenta ser de piloto de testes da Aston Martin ou talvez (mais improvável) no lugar de Fernando Alonso na Alpine. Isto deve-se a dois grandes factores: não estar integrado numa academia de jovens das equipas oficiais; e ter conquistado o título já na sua terceira temporada na categoria.

A juntar a isto há uma percepção geral no paddock de que o nível geral da Fórmula 2 foi inferior ao de anos anteriores (que consagraram pilotos como Oscar Piastri, Mick Schumacher, Nyck de Vries, George Russell e Charles Leclerc), fruto de pilotos experientes que não renderam o esperado (Théo Pourchaire, Liam Lawson,…) e de pilotos ainda na temporada de estreia que esperam pela segunda (Jack Doohan, Logan Sargeant,…).

Não que os pilotos de 2022 não tenham feito performances ótimas. Só que os extremos negativos têm pesado na avaliação. Manobras mal calculadas para as quais não há desculpa, agressividade excessiva ou simplesmente incapacidade de condução para o nível exigido: nenhuma destas é motivo para espanto em categorias júniores mas chegaram a um ponto surpreendente em 2022, com a suspensão de 3 pilotos diferentes.

Os famosos pontos de suspensão utilizados na F1, F2 e F3 estão em funcionamento desde 2014, após uma controversa suspensão de Romain Grosjean em 2012 (com os comissários a decidirem que o piloto já acumulara demasiados incidentes ao longo do ano). A ideia era diminuir a liberdade e subjetividade da decisão de suspender um piloto da parte dos comissários. Quem atingisse 12 pontos era suspenso, com os pontos a perderem validade 12 meses após os incidentes.

Desde a sua implementação que ninguém foi suspenso na F1. Houve casos bem próximos. Sebastian Vettel nos seus tempos de Ferrari em disputa pelo título acumulou uma boa quantia deles. Também Max Verstappen arranjou mais do que o ideal em 2021. Em comum há o facto de estarem em duelo renhido contra o Mercedes de Lewis Hamilton.

Na Fórmula 2, depois do famoso (pelas piores razões) Mahaveer Raghunathan ter conseguido a proeza de acumular 12 pontos duas vezes no mesmo ano, ainda não se tinha voltado a repetir a situação. Pois em 2022, já são 3 os pilotos suspensos…

Os 3 suspensos

Um por um e em fins-de-semana diferentes, os 3 pilotos foram conhecendo as suas suspensões.

O primeiro foi o belga Amaury Cordeel, estreante na categoria ao serviço da Van Amersfoort (também estreante). Sem uma vitória no currículo desde o seu título de F4 Espanhola de 2018 (que chegou a ter corridas de apenas 8 carros), Cordeel tomou a decisão de saltar da F3 para a F2 sem um resultado melhor que 11º num sprint. Os pontos de suspensão do piloto incluíam desrespeito por limites de pista e não se ter alinhado bem na grelha de partida.

O que finalmente o atirou para a sua suspensão foi um incidente em pista na feature de Baku que o eliminou a si e a Ollie Caldwell na partida. Além de não poder participar em Silverstone, o piloto teria que servir uma penalização de 3 lugares na grelha quando regressasse.

Seguinte entre os suspensos foi o outro envolvido na colisão, Ollie Caldwell. O piloto britânico da Campos (com ligações à Alpine), também estreante. Não tendo sido excessivamente competitivo naquela que tinha sido a sua segunda temporada de F3 (foi 8º em 2021), também tinha sido surpreendente vê-lo chegar à F2. Aqui poderá ter jogado o facto de uma terceira temporada na F3 ser pouco recomendável para perspetivas de carreira futuras…

A maioria dos pontos de suspensão de Caldwell foram obtidos da mesma maneira que o que finalmente o suspendeu em Budapeste: curvas cortadas.

Por último, temos Roy Nissany da DAMS que está muito longe de ser um estreante. Piloto de testes da Williams nos últimos anos e apoiado de forma significativa por fundos do seu país natal, Israel. Sem vitórias desde 2017 (na World Series by Renault), Nissany está na F2 desde 2018 e não conseguiu ainda um pódio.

O piloto tem-se tornado conhecido por alguma agressividade excessiva, como se viu pelo perigosíssimo acidente que provocou em Silverstone com Dennis Hauger (que lhe valeu pontos de suspensão). A gota de água que o expulsou foi a sua condução errática atrás do Safety Car em Zandvoort.

A subida dos pilotos pagantes ao extremo

Um padrão emerge quando se analisam de seguida estes exemplos. Estamos a falar de pilotos que pela sua inexperiência, falta de andamento, ou mistura de ambas, não estão preparados para estar integrados no campeonato de Fórmula 2.

Em condições normais nenhuma equipa faria questão de ter a sua imagem associada a comportamentos como os demonstrados, preferindo ter alguém mais capaz ao volante. Mas em anos recentes, apesar de alguns esforços (tímidos) da FIA, os orçamentos necessários para chegar à F2 têm subido (neste momento crê-se rondarem os 3 milhões de dólares).

Assim, têm sido vários os pilotos de F3 e similares que não conseguem dar o salto para a F2, mesmo quando têm os resultados para o fazer. Um exemplo recente que no final correu pelo melhor foi Logan Sargeant: o americano quase foi campeão de F3 em 2020, ficou sem orçamento e aceitou voltar à F3 na equipa pior classificado, até ser repescado pela Williams que lhe pagou um programa de F2 na Carlin em 2022.

Ora, uma vez que as equipas de F2 continuam a precisar de completar os seus alinhamentos, isto abriuas portas a uma variedade de estranhos pilotos a competirem na mesma grelha que alguns dos mais talentosos pilotos júnior.

O caso mais mediático recente foi o de Mahaveer Raghunathan, indiano a correr com uma licença holandesa, que atingiu um nível tão absurdo de falta de preparação para as tarefas que desempenhava que recebeu a alcunha sarcástica de “Lorde Mahaveer” dos fãs. Quase sempre em último e quase sempre a arranjar sarilhos, o piloto da MP em 2019 atingiu o limite de pontos de suspensão duas vezes no mesmo ano (apenas cumprindo a primeira suspensão, porque a segunda foi obtida na última corrida do ano)…

Menos badalado mas igualmente inacreditável foi o de Alessio Deledda. Sem ter sido melhor que 20º na F3 em 2020, o italiano achou estar preparado para subir à F2 em 2021 com a HWA Racelab (uma estrutura que nunca atingiu um bom nível na categoria). Mais conhecido por quebrar limites de velocidade em autoestradas com carros de alta cilindrada que pelo seu ritmo em pista, Deledda qualificou-se a mais de 2 segundos do penúltimo e apanhou uma volta de avanço nas corridas em Monte-Carlo.

Uma categoria que permite a estreia destes pilotos dificilmente está com uma saúde financeira tão recomendável quanto isso. Muitas equipas já correm com a ideia de ter um piloto “a sério” e um pagante lentíssimo. A Virtuosi este ano corre com o muito promissor Jack Doohan num carro e Marino Sato (que pontuou uma única vez em 2021 e 2022) no outro.

Encurralada entre as academias de pilotos das estruturas da F1 e os pilotos ridiculamente mal-preparados mas com dinheiro, a Fórmula 2 precisa rapidamente de arranjar forma de tornar os seus lugares mais sustentáveis, sob pena de acabar com carreiras promissoras e de ver as suas provas transformarem-se num circo.

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Fontes:
Feeder Series \ Pontos de suspensão
Formula Scout \ Suspensão Cordeel
GP Blog \ Pontos suspensão Verstappen
Motorsport Week \ Suspensão Caldwell
Motorsport Week \ Suspensão Nissany
Race Fans \ Cordeel quase outra vez suspenso
Race Fans \ Pontos suspensão Vettel 2019


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